Linguagem neutra contribui para a evolução da nossa língua

No começo, senti estranhamento e achei bizarrice. Vejam só o poder do preconceito. Depois, ainda reagi, considerando que os movimentos sociais de libertação não deveriam afetar a Sagrada Língua Portuguesa, alterando a grafia de palavras com o uso do “x”. Confesso que estava errado. Aprendi a lição e, agora, vejo que novos estudos estão colocando as coisas em seus devidos lugares.
A Rádio USP divulgou matéria em que aborda a linguagem neutra, que pode ser considerada movimento social e parte da evolução da língua. Segundo especialistas, o objetivo é tornar a Língua Portuguesa inclusiva àqueles que não se sentem abrangidos pelo uso do masculino genérico. A proposta é de reflexão sobre representatividade e objetiva acolher transexuais, travestis, não-binárias, intersexo ou que não se sintam abrangidas pelo uso comum. Apesar de amplas discussões sobre o tema nas redes sociais e entre linguistas na academia, a linguagem neutra ou linguagem inclusiva não é uma nova norma, mas uma tentativa de alguns falantes para que o Português possa abranger uma parcela invisibilizada da população.
Monique Amaral de Freitas, doutoranda do Departamento de Linguística da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, explicou que, “para se referir a um coletivo de pessoas, a categorias ou coisas desse tipo, não se utiliza o masculino na linguagem neutra. Desse modo, não se apaga a existência do gênero feminino ou mesmo de um gênero não binário, ou seja, nem masculino nem feminino”.
Existem diversas propostas de modificação para garantir a inclusão. Algumas já são consideradas inadequadas, como o uso do “X” ou do @, porque dificultam a fala e a leitura. Para tornar a frase neutra, basta não deixar evidente o sujeito da frase, porque desse modo não se utiliza o masculino genérico e não ocorre a flexão de gênero. Ou é só substituir a vogal temática e o artigo pela letra “E”, pelo “I” ou mesmo pelo “U”. Por exemplo, a frase “os educadores brasileiros” se torna “es educadores brasileires” quando as vogais temáticas são trocadas por alguma letra que remete à neutralidade, como o “E”.
Para Heloisa Buarque de Almeida, professora do Departamento de Antropologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP e pesquisadora do Núcleo de Estudos sobre os Marcadores Sociais da Diferença (Numas), a demanda por uma linguagem inclusiva pode ser considerada um movimento social e faz parte da evolução da língua. “É interessante entendermos isso como um movimento social e de transformação. Há discursos conservadores que acham que as coisas são fixas, mas não é assim e nunca foi.”

Por Luiz Gonzaga Neto