Os mais ricos são menos taxados proporcionalmente

A impressão é de que a grande mídia fala sempre com estratos já alcançados por esse tipo de informação.

Por Luiz Gonzaga Neto

Reclamar dos impostos é hábito comum da elite brasileira. Mas uma comparação internacional mostra que a parcela mais abastada da população não paga tantos tributos assim. Estudos indicam que são justamente os mais pobres que mais contribuem para custear os serviços públicos no país, alerta artigo da BBC Brasil. A mídia tem insistido o suficiente sobre esse tema da desigualdade tributária? É um tema complexo, técnico e também político, e corremos aqui o risco de sermos superficiais. Mas vamos lá!
A impressão é de que a grande mídia fala sempre com estratos já alcançados por esse tipo de informação. Será que as pessoas mais pobres têm consciência sobre o que acontece com a cobrança de tributos? Segundo Alexandre Sampaio Ferraz, economista, doutor em ciência política e assessor técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), os baixos salários não livram o brasileiro de pagar um dos mais altos impostos sobre o consumo do mundo, mas os livra de pagar o IRPF (Imposto de Renda de Pessoa Física). Somos o 8° país que proporcionalmente mais taxa o consumo no mundo, dos 61 países analisados pela OCDE. Não existe cidadão que não queira ganhar mais do que R$ 1.900 por mês, ou ter mais de R$ 300 mil em bens e direitos e, assim, poder pagar o IRPF. Mas nada menos do que 70% dos brasileiros estão fora do seleto grupo dos declarantes; são os isentos da Receita.
Segundo Sampaio Ferraz, o Brasil passou a adotar o imposto de renda em 1922, e logo estabeleceu a progressividade. No ano base de 1988, ainda tínhamos nove faixas com alíquotas que variavam de 10% a 45%. Mas a minoria organizada exerceu eficientemente sua voz no novo período democrático. No ano seguinte, passaram a ser apenas duas alíquotas, a maior de 25%. Em 1994, introduziu-se uma nova alíquota e a máxima subiu para 35%.
Mas a grita levou a uma nova redução para duas faixas/alíquotas, com a máxima de 25%, que em 1998 passaria aos 27,5% atuais. Sem conseguir implantar a “progressividade para cima”, implantaram a “progressividade para baixo”. Em 1999, criaram as alíquotas de 7,5% e 22,5% ao lado da antiga mínima de 15%, que vigorava desde 1992. Não é simples implementar a progressividade e sobretudo taxar os mais ricos. A alíquota padrão ou de referência não é, na verdade, a alíquota efetiva paga pelos declarantes. A tributação do IRPF varia também por tipo de rendimento auferido no ano e ainda tem as isenções legais. Ocorre que justamente os mais ricos têm mais rendimentos provenientes de fontes com tributação exclusiva e isentas de imposto, enfatizou Sampaio Ferraz.
É por isso que a mídia fala tanto em reforma tributária? É talvez uma das razões. Mesmo os 1% mais ricos podem se achar injustiçados, pois enquanto os 10% mais “pobres” deste grupo pagam alíquota de 8,8% sobre a renda, os 10% mais ricos pagam uma alíquota efetiva de apenas 2,5%. A pontinha da cauda é ainda mais cruel: os 2.984 declarantes com maior renda pagaram efetivamente em 2018 apenas 1,6% em imposto sobre a renda total declarada. Não resta dúvida que os mais ricos pagam proporcionalmente menos, e não mais, como tenta estabelecer a teoria. E até aqui foram eficientes em imprimir sua agenda: chega de impostos! Mas a reforma tributária e a atual crise econômica podem ter aberto uma janela de oportunidade para mudarmos esse jogo, em direção a um país mais justo e com menos desigualdade, concluiu Alexandre Sampaio Ferraz. Você concorda, caro leitor?