O icônico João Alves e o Circo Guarany em Atibaia

Ao todo eram cerca de vinte artistas que integravam a trupe.

Márcio Zago

Atibaia no passado poderia ser consideradaimportante rota para os circos nacionais. Não só pela quantidade, mas pela qualidade dos profissionais que por aqui passaram. São os casos de Benjamim de Oliveira e João Alves, dois ícones e referencias obrigatórias da historiografia das primeiras geraçõescircense no Brasil. João Alves nasceu no dia 23 de novembro de 1871, emSão João del-Rei-MG, meses antes da aprovação da lei que declarava livres todos os “filhos de mulher escrava” que nascessem no império a partir de então. Filho da negra escravizada Leopoldina Souzae do português Francisco Alves, João Alves da Silva criou ogrande Circo Teatro Guarany e se tornou uma das personalidades mais importantes na história das artes circenses do país.
O Circo Guarany aportou por aqui em 1908, anunciado com grande entusiasmo pelo Jornal “O Atibaiense”. Fato curioso é que na biografia do circo, seu surgimento se dá em 1909, um ano depois de se apresentar na cidade. Nota-se pelo texto do jornal que o Circo Guarany, nessa época, já apresentava infraestrutura consolidada, com inúmeras atrações que colocam em dúvidas tratar-se de uma companhia recém-criada. Compunha a programação as atrações equestres, ginastas e zoológicas, além das pantomimas, com destaque para as atuações de seu proprietário, o artista e empresário João Alves.
Ao todo eram cerca de vinte artistas que integravam a trupe. Em Atibaia o circo se manteve lotado em todas as apresentações, exceção para os dias de chuva intensa,próprio do final do ano, quando as sessões foram suspensas em razão do alagamento completo do circo. Os cães e os cavalos adestrados foram as grandes atrações do circo além,claro, das pantomimas, tendo sempre João Alves como o principal protagonista. O tema girava em torno de situações com forte apelo popular como “O crime da Rua da Carioca”, versão teatralizada de fatos reais ocorridos na então capital federal ou “O Crime da Mala”(não confundir com o caso ocorrido em 1928 que ficou nacionalmente conhecido com o mesmo nome). Uma das características que marcaram o Circo Guarany foi à utilização da via férrea para sua locomoção: vagões inteiros eram reservados para o transporte de sua infraestrutura pelo país. Em Atibaia não há informações de que esse método tenha sido utilizado.
Depois de permanecer cerca de um mês em Atibaia, o Circo Guarany rumou para Piracaia, onde permaneceu por mais um mês, retornando mais tarde para as festividades de final de ano, data em que o centro da cidade recebia grande número de moradores da região rural. Os espetáculos ocorreram inclusive no dia 24 de dezembro, sempre com muito sucesso. Depois daqui o Circo Guarany rumou para o sul do país. Outro fato curioso, colhido na internet, dá conta que a filha de João Alves, Maria Eliza Alves dos Reis, foià primeira palhaça negra do país. Ela interpretava o Palhaço Xamego no circo do pai. O Circo Guarany durou até 1954, quando foi vendido após o falecimento de João Alves.

Márcio Zago é artista plástico e artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”. É criador e curador da Semana André Carneiro.