O Clube Literário de Atibaia

Márcio Zago

No inicio do século XX a elite letrada do município já sentia a necessidade de um espaço dedicado exclusivamente ao livro e as manifestações intelectuais. Num artigo de 1901, publicado no jornal “O Atibaiense”, seu editor e fundador José Antônio Silveira Maia escreveu sobre a lacuna existente nessa área. Lembrava que outras cidades menores que Atibaia já possuía uma biblioteca e sugeria que o Club Recreativo Atibaiano tomasse a iniciativa de montá-la em suas dependências. Em 1904 é publicado outro artigo, dividido em três edições seguidas com o título “Gabinete de Leitura e Escolas Noturnas”. Provavelmente escrita pelo mesmo autor do artigo anterior, este material está incompleto e bastante danificado, mas percebe-se que seu conteúdo expressa a preocupação em “selecionar” os livros que iriam compor uma possível biblioteca. Eles deveriam ser instrutivos e moralmenteaceitos, uma preocupação da época.
No ano seguinte uma pequena nota do jornal informava sobre o interesse da diretoria do Clube Recreativo em montar uma biblioteca para a “diversão e ilustração de seus associados”, fato que não ocorreu. Uma década depois surge outra noticia no mesmo jornal revelando o interesse de alguns professores do Grupo Escolar em organizar “estudos de línguas, das questões científicas e uma biblioteca”. Novamente nada aconteceu. Mais dois anos se passaram e outro artigo é publicado com o título “Club Literário”: “Sabemos que entre professores do Grupo e alguns cavalheiros distintos da nossa elite, cogitam na organização de um Club Literário nesta cidade e a formação de uma biblioteca, provisoriamente particular privativa aos associados, contando para levar a efeito essa utilíssima ideia fortes elementos.

O Club Literário terá os seus estatutos organizado com programa belíssimo: sessões literárias, conferências pelos sócios, semanal ou mensalmente.
A ideia é magnífica, Atibaia pelo seu adiantamento intelectual faz se sentir por demais a criação de uma sociedade onde a gente possa se instruir, passando horas agradáveis em literaturas amenas, um centro onde se possam ouvir as maiores mentalidades da localidade e visitantes ilustres que nos venham honrar com suas presenças. Os promotores dessa gigantesca ideia não devem descurar, pois cremos que terá a aceitação geral da população ilustrada desta cidade, que em massa pressurosa concorrerão com tudo que estiver ao seu alcance para que vinque essa belíssima associação literária”. Novamente nada aconteceu. A dificuldade encontrada em montar uma biblioteca vinha do contexto bastante desfavorável da época.
A cidade, eminentemente agrícola, tinha a maior parte da população formada por trabalhadores rurais sem qualquer escolaridade. A leitura era, portanto, reservada a uma pequena elite. Soma-se a dificuldade em obter o próprio livro, que naquele inicio de século XX era caro e de difícil acesso. Somente em 1915 surge um dos primeiros anúncios relativos à venda de livro em Atibaia. Tratava-se da recém-inaugurada “Papelaria Atibaiense”, de B. Florido & Cia, que ficava na Rua José Alvim. No “reclame”, além da venda de objetos e artigos para escritório, como canetas, penas, tintas, blocos de papel, livros escolares, cadernos de música, solfejos e cadernos de caligrafia, a papelaria vendia também livros a 600 Réiscada. Entre os títulos a venda estava: Iracema, de José de Alencar; Marilia de Dirceu, do Gonzaga; O Rei Peste, de E. Poe; O Homem e o Espectro, de Dickens, entre outros. Em 1916, depois de algumas reuniões, surge nova tentativa de montar uma biblioteca na cidade: o “Gabinete de Leitura”. Assunto para o próximo artigo.

* Márcio Zago é artista plástico, artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”.
Criador e curador da Semana André Carneiro.