O Clube Recreativo Atibaiano e a dança

O Clube Recreativo Atibaiano foi fundado no dia 10 de agosto de 1897, quando foi instalada uma casa de recreação na residência do Vautier, no largo da matriz.

Márcio Zago

A dança praticada pela elite local teve suas raízes nos encontros realizados em suas próprias residências, mas com a fundação do Clube Recreativo Atibaiano, a dança passou a ter um espaço próprio de realização, ganhando destaque como importante aglutinador social ao proporcionar um ambiente de estímulo e aprendizagem para a manifestação. Pinçando aqui e ali, é possível recompor como eraeste espaço no final do século XIX e início do XX.
O pesquisador João Batista Conti escreveu: “Para dar ambiente à mocidade ruidosa dos fins do século XIX, fundou-se o Clube Recreativo Atibaiano no dia 10 de agosto de 1897, quando foi instalada uma casa de recreação na residência do Vautier, no largo da matriz, inaugurado pelo juiz de direito da comarca de Atibaia. Foi um acontecimento para a sociedade atibaiense, que pôde desfrutar de reuniões literárias, conferências importantes, como as proferidas por Afonso de Carvalho, Dr. Vivalva, Paulo Duarte e tantos outros, além de bailes e festas”.
Outro pesquisador, o Waldomiro Franco da Silveira, também escreveu sobre o clube: “Depois… O Clube apertado entre o escritório de Juvenal e a loja de Cintra & Almeida; na saleta logo à entrada, em torno de uma mesa redonda, reuniam-se habitualmente para o carimbo João Pires, Maneco Netto, Teófilo Urieste, João Pires, Quilim Marinho, Adolfo Alves e o Dr. Vairo; à tarde, em cadeiras postadas na calçada, sentavam-se para os comentários do dia Aprígio de Toledo, Alcides Cunha, Batistinha, Nhônhô Santos, Pedro Palhares, Chico Soares e Nhô Bim. Nos fundos do Clube, o Bépe mantinha um pequeno botequim onde o barbaçudo Ventura servia sanduíches de salame e mortadela aos mais gulosos, ou então pastéis feitos aos sábados, e que ficava à venda a semana toda”.
Sobre os bailes da época, a melhor descrição fica por conta de Francisco da Silveira Bueno: “Só penetravam os sócios e tudo se passava num mistério religioso; nós outros, embarafustávamos numa correria pelos salões adentro, sendo logo expulsos pelo Peppe, de lembrada memória, ou ficávamos de fora, à procura de alguma fresta para espiar. Dançavam os pares mudos, extremamente cerimoniosos, forrando o cavalheiro a mão direita com o simbólico lenço de seda branca.
A quadrilha era indispensável, sendo um gozo puríssimo ouvir o vozeirão do marcante, dirigindo os lances da dança, numa algaravia de francês arrebentado e português mal sabido…”. Para completar nossa tentativa de traçar um panorama do clube segue uma irônica matéria a título de curiosidade. Ela foi publicada no jornal “O Atibaiense” em 1901, e brinca com o nome de diversos diretores do clube e seus frequentadores: “Um curioso, no princípio da semana, observou-me que o Clube Atibaiano tem muitas incoerências e contradições. Perguntando-lhe eu, espantado, quais eram aquelas e estas, ele respondeu-me: pois que quer? É um clube que tem quatro Oliveiras e nem uma azeitona; quatro Campos e nem um gado; sete Cunhas e nem um pau para rachar; cinco Pires e nem uma xícara; quatro João-batistas e nem um profeta; dois Ramos e nem um galho; três Peçanha que não têm peçonha; dois Domingos e nem um dia santo.
Além disso, há quatro sujeitos de Toledo que nunca viram a cidade de Toledo, na Espanha; dois Soares que não têm só ares; três Marinhos terrestres; uma Maria que não é mulher; um Vairo que não é desvairado; um Lisboa que não é cidade, um Cândido que nada tem de cândido, um Barreto que não usa barrete; um Duo que pode cantar solo; uma Lima que não se come; dois Leites que não se bebem; um Chamadoira que não chama ninguém; e até um Carvalho que nunca foi árvore.” O Clube Recreativo Atibaiano, desde sua fundação, abrigou inúmeras atividades recreativas e culturais na área do teatro, da literatura e das apresentações musicais, mas foi na dança de salão que o clube ganhou destaque e reconhecimento pela intensa colaboração que prestou no desenvolvimento dessa linguagem. Prestigio que dura até hoje.

* Márcio Zago é artista plástico, artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”.
Criador e curador da Semana André Carneiro.