O desenvolvimento da arte fotográfica em Atibaia

Márcio Zago

Até a primeira década do século XX, o registrofotográfico em Atibaia estava intrinsicamente ligada a Bragança Paulista. A nova linguagem não havia se estabelecida na cidade e dependia dos fotógrafos ambulantes que se instalavam provisoriamente na cidade, a maioria vinda de lá. Do click inicial até a imagem no papel era um longo processo que envolvia o conhecimento técnico do equipamento, o conhecimento estético para o registro fotográfico (que incluía a quantidade exata de luz), além do conhecimento químico da revelação, uma vez que tudo era produzido pelo próprio fotógrafo.
Os chamados “ateliers fotográficos” reuniam num só espaço o estúdio, onde o interessado pousava para a foto, e o laboratório onde eram manipulados os produtos químicos utilizados na revelação. Em Atibaia o primeiro atelier fotográfico foi montado em 1908 pelo fotógrafo Calixto Rinaldi em sua própria residência. Calixto Rinaldi foi o primeiro fotógrafo de Atibaia, profissão que aprendeu com o fotógrafo José Abramo, que mantinha em Bragança o “PhotographiaAbramo”, na Rua Dr. Cândido Rodrigues, 51. Calixto Rinaldi era seu assistente e representante em Atibaia desde 1904 e logo abriu seu próprio atelier. Em 1910 o jornal “O Atibaiense” publicou um pequeno anúncio onde Alfredo André oferecia a revista “O Malho” por 500 Reis.
O curioso é que no endereço para a compra da revista constava “Photographia Atibaiense”, indicando tratar-se de um segundo atelier fotográfico de Atibaia. Alfredo André, filho de Olímpio da Paixão, exerceu inúmeras atividades: professor; dono de escola; agente dos correios; advogado provisionado e outros. Em 1913 funda o jornal “A Cidade”, que permaneceu ativo por quinze anos, mas sua grande contribuição foi na cultura. Artista multifacetado trabalhou em peças teatrais no Teatrinho do Mercado integrando a “Sociedade Dramática”, fez parte de um grupo musical ao lado de Leôncio e Juvêncio Fonseca, escreveu e fez traduções literárias, mas foi na fotografia que teve o maior destaque. Alfredo André pode ser considerado o nosso Militão Augusto de Azevedo, fotógrafo da virada do século XIX para o XX que registrou com precisão as alterações da paisagem urbana paulista daquele período. Alfredo André, guardadas as devidas proporções, também deixou um registro primoroso de nossa paisagem urbana que preserva,ainda hoje, os detalhes das nossas origens. Alfredo André e Calixto Rinaldi foram amigos e tinham vários interesses em comum. Provavelmente Alfredo André se interessou pela fotografia através do amigo, mas em 1910 Calixto Rinaldi, e seus familiares, mudam para a Itália deixando todo arquivo e equipamentos fotográficos com o Benedito Pierotti, outro jovem fotógrafo da época. Anos depois um anúncio de jornal informava que Calixto Rinaldi retornaria em breve da Itália para instalar em Atibaia um grande atelier, onde poria em prática tudo que aprendeu na Europa sobre a linguagem.
Neste período, enquanto Calixto Rinaldi deixou de exercer a profissão em Atibaia, Alfredo André prosseguiu e se transformou em nosso maior fotógrafo naquele inicio de século XX. Com o tempo a fotografia se popularizou, abrindo espaço para outros ateliers no município como a “Photographia Salles” do fotógrafo João Salles, de 1914, instalado no Largo da Matriz, ou a Casa “Photographia” de Guilherme Hasse, instalada na Rua Tomé Franco, esquina com a José Bim, em 1917, e mesmo a”PhotographiaAbramo”, que mais tarde abriria uma filial em Atibaia. O aumento dos clichês fotográficos, utilizados pelos jornais da época, também favoreceram a expansão da fotografia como meio comercial, somados a crescente procura da fotografia por parte da população em geral. A fotografia deixava de ser exclusividade da elite econômica e chegava ao cidadão comum, que também queria ser eternizado numa imagem. Uma nota curiosa surge em 1909 quando o jornal “O Atibaiense” informava sobre um processo aberto por uma parisiense contra um fotógrafo.
A senhorita informava ter sido fotografada e exibida publicamente sem o seu conhecimento. O fotógrafo alegava que a fotografou em razão do bonito “toilette” que trajava no baile, não vendo problema em transformar a imagem num pôster, mesmo porque ele julgava ser o legítimo proprietário da chapa. Na sentença final o juiz deu ganho de causa ao fotógrafo, mas proibiu a utilização da fotografia sem o consentimento da moça. Como se vê nada é novo nesse mundo… A polêmica sobre o uso da imagem vem de longa data.

* Márcio Zago é artista plástico, artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”.
Criador e curador da Semana André Carneiro.