Uma programação supimpa!

Márcio Zago

Depois de inaugurado, o grande desafio dos proprietários do Pavilhão Receio Cinema foi manter a casa cheia. Era o primeiro cinema da cidade (uma novidade), portanto não havia concorrência, mas isso não era suficiente para lotar semanalmente seus690lugaresdisponíveis. Principalmente se levado em contra que a população da épocaera de aproximadamente 11.000 habitantes, dos quais somente 2.000 moravam na cidade, ou seja, era necessário atrair quase metade da população urbana para cada exibição.Visando uma divulgação mais eficiente as publicações sobre o cinema passaram a ser frequente no jornal “O Atibaiense”. Elas detalhavam a programação eincluíam o nome dos filmes, a metragem, o fabricante e os atores que começavam a ganhar familiaridade entre os frequentadores do espaço.
Publicações como esta: “Conforme prevíamos os espetáculos de sábado e domingo, que a esforçada empresa reservou aos seus habitués,foram concorridíssimos. O programa para hoje basta para atrair uma numerosa casa, pois além de variado, conterá muitas novidades da arte cinematográfica como: Um estupendo filme dramático da considerada fábrica Nordisk – Uma Vida Desregrada, com 1.600 metros em 3 atos a 80 quadros. O Filho da Rainha Cega – maravilhosa fita colorida da afamada Casa Gaumont, com 600 metros; A Flecha Envenenada – drama indígena, com 630 metros, maravilhosamente desempenhada.
Uma das melhores criações da importante Casa Vitagraph. Como de praxe finalizara o espetáculo a fita do nosso levado da breca: Tontolini”. E aqui cabem algumas observações sobre a matéria acima: Os títulos dos filmes começaram e ter importância quando a simples projeção deixou de ser novidade, exigindo histórias com inicio, meio e fim;O anuncio dos filmes em metros orientava os espetadores em relação a sua duração; O destaque ao “fabricante” era em razão da ascensão da linguagem como indústria de entretenimento; As fitas coloridas, anunciados com ênfase, eram originais em preto e branco que passavam por processos artificiais de colorização, ou de forma monocromática (onde a fita era mergulhada numa única tinta), ou colorida à mão, quadro a quadro. Filmes capturados originalmente em cores, como conhecemos hoje, só se popularizou anos depois. Por fim o destaque aos nomes de alguns atores que começavam a fazer sucesso pela frequência com que apareciam nas fitas. Nomes como Tontolini, Leopoldo Fregoli e outros.
Para aumentar a receita os empresários vendiam guloseimas de cadeira em cadeira, ou então numpequeno espaço interno do cinema, como anunciadoem maio de 1912, no jornal “O Atibaiense”: “Nos intervalos, no botequim do Sr. Alberto, ele, todo prazenteiro oferecerá deliciosos chocolates de cacau, mas… já se sabe, o freguês pagando-lhes 4 niqueis de 100 réis.
A tigela é grande e quase a derramar!”. Outra medida adotada para engordar a receita foi intensificar o anuncio interno, que ocorria a cada intervalo entre as trocas das fitas nos projetores. Nestasocasiões o empresário Deoclides Freire anunciava ao público presente as promoções das lojas e das pequenas empresas da cidade, além de chamar a atenção para os filmes que seriam exibidos em seguida “Não percam o espetáculo. É sensacional, é belíssimo, é supimpa!”. Essa maneira de anunciar (uma espécie de pregão) foi introduzida pelo Deoclides Freire quando o “Recreio Cinema” ainda funcionava no teatrinho do mercado, e teve continuidade no Pavilhão Recreio Cinema elevando a fama do empresário de grande “reclamista”, marcado com a frase: “É sensacional, é belíssimo, é supimpa!”. Outra maneira encontrada pelos proprietários do cinema para atrair o público foi diversificar seu uso, abrigando bailes, festas e apresentações cênicas. Assunto para a próxima semana.

* Márcio Zago é artista plástico, artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”.
Criador e curador da Semana André Carneiro.