Cinema e patinação em 1915
Eventos como quermesses e outras atividades que utilizavam o tempo ocioso do espaço para gerar renda extra também passaram a ocorrer com frequência.
Márcio Zago
Apesar do sucesso que o cinema fazia naquele inicio de século XX, considerado uma atividade bastante promissora na época, manter dois cinemas em funcionamento numa pequena cidade como Atibaia não era tarefa fácil. Os empresários locais bem que se esforçavam… Além de manter a função hibrida entre cinema e teatro, bem aos moldes das casas de diversões da capital, os empresários buscavam uma diversidade que ia além do revezamento entre as fitas e apresentações teatrais. Eventos como quermesses e outras atividades que utilizavam o tempo ocioso do espaço para gerar renda extra também passaram a ocorrer com frequência.
Em 1915 a grande novidade em Atibaia foi à patinação trazida pelo empresário Deoclídes Freire, do Pavilhão Recreio Cinema.A patinação no gelo não era novidade nos países gelados. Segundo uma rápida pesquisa na internet “Estima-se que o ato de patinar no gelo exista há três mil anos (será?) e a combinação entre patinação e arte tenha surgido no Século 18.
Contudo, foi no Século 19 que a Patinação Artística tomou forma graças ao trabalho do norte-americano Jackson Haines, que incorporou elementos da dança e do ballet em suas apresentações”. Mas até esse momento a patinação estava condicionada a existência do gelo. Foi quandoem 1863 o americano James Plimpton patenteou um novo design de patins projetado com quatro rodas, além da base flexível de forma que o patinador pudesse se inclinar para direcionar os patins.
Este novo design foi um sucesso e garantiu a primeira pista pública de patinação em Nova York. No Brasil a novidade chegou ao Rio de Janeiro em 1872,no Teatro Pedro II, através do empresário Bartholomeu Correia da Silva, virando moda entre a população mais abastada. Em Atibaia chegou depois de quatro décadasde atraso. Em outubro de 1915 O Atibaiense publicou: “Com grande sucesso realizou-se no domingo passado na plateia do Pavilhão Cinema desta cidade a inauguração da patinação, a qual foi concorridíssima tanto pelas senhoras e senhoritas como por cavalheiros. Hoje, das 14 às 15 horas realizar-se-á um desafio de 20 voltas na pista entre os senhores Evaristo Caldeira com bicicleta e Gumercindo Amorim com patins.
O prêmio ao vencedor será a entrada permanente no cinema por dois meses (…)”. A competição e o teste de habilidades entre os patinadores passaram a ser a grande atração da casa. Além da disputa de velocidade havia outros desafios aos patinadores como: enfiar uma linha na agulha durante o percurso de dez voltas; comer um prato de doces sem cair (também durante dez voltas) ou apanhar uma galinha de angola arisca que seria solta na pista, mas sem machucar o bichinho e, claro, sem cair.
Apesar do esforço do empresário, logo a novidade perdeu o interesse da população e o grande desafio passou a ser novamente do próprio empresário em manter seu negócio funcionando: “Devido ao excessivo calor que tem feito e a pouca frequência de patinadores a empresa do pavilhão Cinema resolveu suspender temporariamente desde domingo passado esse gênero de “sport”, reabrindo em tempo oportuno”. Esse anúncio saiu meses depois do primeiro anuncio falando da inauguração. Sinal de que o grande sucesso da patinação era, na verdade, um voo de galinha… E de angola.
* Márcio Zago é artista plástico, artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”.
Criador e curador da Semana André Carneiro.