Surge a crítica teatral em Atibaia
Márcio Zago
Em abril de 1904 o teatrinho da cidade recebia o sexto recital do Grupo Dramático Carlos Gomes com o drama “A Herança de um Marinheiro” e a hilariante comédia “Os Dois Jucas”. “O Atibaiense” foi bastante favorável a todos os participantes, com destaque para o acompanhamento musical da orquestra do professor Salles Bastos, fato que se tornava constante em todas as apresentações que realizavam.
Em seguida veio à peça “Sombras e Coloridos”, tendo desta vez uma crítica de Aprígio de Toledo, importante figura pública daquele inicio de século. Orador nato e muito estimado pela sociedade local, Aprígio de Toledo tinha intensa participação na vida cultural da época e falava com propriedade sobre o assunto, integrante que foi de uma trupe teatral que percorreu o país.
Na citada crítica surge pela primeira vez a descrição do conteúdo temático de uma peça encenada na época, além de observações relativas à atuação dos atores, não faltando “puxões de orelhas”: “A peça com quanto não se distinga pelos seus elevados méritos literários, é das que muito agradam pelos grandes lances comoventes que apresentam. O Barão de Lagardeira negava sua filha em casamento a um jovem operário e pretendia casá-la com um rico industrial, seu amigo. A moça persiste nas suas juras de fidelidade ao noivo eleito de sua alma e não recua sequer a obstinação paterna. Por fim o Barão arruína-se e o industrial retira a sua pretensão ao casamento com a filha daquele.
O Barão compreende o nada das grandezas mundanas. Um sacerdote intervém, consolando o Barão que decide dar a mão da filha ao operário. Uma grande bomba põe termo a peça, com a declaração que faz o sacerdote de que aquele jovem é seu filho legítimo, havido no tempo em que a perda da esposa amada não se havia dado, desiludindo-se das alegrias da vida para lança-lo a carreira sacerdotal.
O Sr. Napoleão Maia, habilíssimo, deu-nos um excelente Barão de Lagarteira, com toda arrogância da sua postiça fidalguia. Melhor interprete não poderia obter o Padre Joaquim, que na pessoa do senhor José Silvério soube conduzir o papel com toda a sobriedade, ajustando-se a todas as linhas da personagem. O Senhor Antônio de Almeida, o Guilherme, ótimo como sempre. Competentemente grotesco o tipo de João Rebello, apresentado pelo Sr. Antônio Brazil. A senhora NievesPaganelli saiu-se, como sempre, bem no interessante papel de Julia.
Do senhor Jeronymo Momo, nada podemos dizer em vista de se tratar de uma representação realizada por uma sociedade particular. Entretanto, se mesmo assim nos for permitido fazer justiça diremos que ao Senhor Momo falta língua e intuição artística. Este amador tem, além de outras, o gravíssimo defeito de extrapolar horrivelmente o idioma vernáculo, o que é detestável. A sua figura desagrada, principalmente quando, nos melhores lances dramáticos, a fisionomia se lhe desmancha em esgaros e momices e a gesticulação cai após grandes frases exageradas e pretenciosas. Somos de opinião que a Sociedade nada perderia com a eliminação deste amador.
A peça estava boa, porém, seria melhor se tivesse mais alguns ensaios. Na comédia os dignos amadores arrancaram do público estrondosas gargalhadas (…). Como se nota, embora realizado somente por amadores, a expectativa era de que as apresentações do teatrinho fossem profissionais e neste sentido a critica de Aprígio de Toledo tinha uma função formadora, embora ácida e até injusta para com Jeronymo Momo, artista dedicado, que contribuía constantemente com várias funções no Grupo Dramático Carlos Gomes: Da confecção de cenários a pintor ornamental das paredes do teatrinho do Mercado…