Cultura e organização no início do século XX em Atibaia
Marcio Zago
No final de século XIX, e principalmente na primeira década do século XX, foi o período da urbanização da cidade. Em 1895 era inaugurado o sistema de água encanada. Depois,em 1901, veio o telefone seguido da inauguração do Grupo Escolar, a instalação da luz elétrica, a fábrica de tecidos e o esgoto.O centro da cidade se expandia induzindo asociedadeatibaianaa se organizarem em associações, agremiações e clubes. A intenção era agrupar pessoas com interesses comuns em ações sociais, recreativas, esportivas, filantrópicasou culturais.
O mesmo fenômeno acontecia nos bairros e cidades vizinhas, onde a urbanização também ocorria.Em Bragança Paulista foi fundado o Clube Literário Bragantino, em 1894. Três anos depois foi à vez de Atibaia fundar o Clube Recreativo Atibaiano, existentes até hoje.No esporte surgiu o Atibaiense Foot-Ball-Club, em 1907. Mais tarde o Atibaia Sport Aymoré e o Sport Clube Operário em 1911, seguidos de outras agremiações. Em 1906 os imigrantes italianos trazem para Atibaia um modelo de organização já desenvolvido por seus concidadãos em outros lugares: as Sociedades de Mútuo Socorro.
Como expresso no próprio nome, propunha fortalecer seus associados através da mútua solidariedade entre os filiados, tendo como base a manutenção da identidade cultural. Com a mesma intenção, em 1913, a colônia síria do município também tentou se organizar. Era comum na época a cotização em torno dos desafios de maior vulto financeiro como na construção ou manutenção de alguns espaços públicos.
É o caso da Santa Casa de Misericórdiaou as reformas das igrejas, por exemplo. Na área cultural não foi diferente. As aquisições desse período, referentes às obras de arte, foram realizadas de forma cotizada, quando eram abertas subscriçõesvisando arrecadar os recursos necessários para a compra. Foi o caso das obrasde Benedito Calixto e outras pinturas, além de bustos e hermas adquiridos para a Câmara Municipal e a Escola José Alvim.No teatro, depois do Grupo Dramático Carlos Gomes, organizou-se a SociedadeDramática seguidos de outras agremiações teatrais. Na música, além das bandas musicais, surgiram o Grupo Enterpe, o GrupoLyrico Fragoso-Gusso, a Orquestra Santa Cecília, etc. Na dança o Terpsichore Club.
Na literatura o Gabinete de Leitura, a primeira biblioteca da cidade. Reflexo de uma sociedade em formação, os métodos de organização daquele períodoaparentavamaior empatia, humanidade e solidariedade nas relações, onde o bem comum era o mais importante. Embora verdadeiro, é um entendimento romanceadoe parcial dos fatos.
Nas entrelinhas dos acontecimentoshavia também uma disputa pelo prestígio social, e principalmente, pelo prestígio politico, importante atributo para a manutenção da elite dominante. Fato emblemático é um artigo publicado pelo jornal “O Atibaiense”, de 1912, a respeito da divergência na organização da chapa da nova diretoria do Clube Recreativo:
Lá no Club Atibaiense,
Vae tamanha confusão.
Não há sócio que não pense
Em tão renhida eleição.
Um grupo, aliás, bem decente.
Que merece nossa ajuda
Quer eleger Presidente
O bom Professor Arruda
Outro partido direito
Já trabalha há muitos dias
Por querer que seja eleito
O nosso bom Pedro Elias
De tal forma divergindo
Dá asa a grande arrelia
Parece que tudo vai indo
Para o seio da anarquia.
O cargo de tesoureiro
Sem desfazerem ninguém
Votem no Aparício
E Zé Pereira também.
E para os de secretário
Sem um cálculo profundo
O Justino ao de primeiro
E o Leopoldo o de segundo.
Para o cargo de orador
O Argemiro fica bem
Votem todos nesse amigo
Ou então no
Zé Ninguém!
Márcio Zago é artista plástico e artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”. É criador e curador da Semana André Carneiro.