O gramofone chega aos lares atibaianos

O disco era feito de cera, goma laca, vinil, cobre ou acetato, onde as vibrações sonoras eram transmitidas por uma agulha que percorria o sulco já riscado do disco amplificando o som através de uma corneta.

Márcio Zago

Os aparelhos sonoros chegaram cedo a Atibaia. O lirofone logo em 1901, quando ainda era novidade no país inteiro. Logo veio o gramofone, evolução direta do lirofone, outra novidade que também chegou precocemente por aqui. A grande diferença era que o som emitido vinha de um disco e não mais de um cilindro, como anteriormente.
O disco era feito de cera, goma laca, vinil, cobre ou acetato, onde as vibrações sonoras eram transmitidas por uma agulha que percorria o sulco já riscado do disco amplificando o som através de uma corneta. O aparelho era movido à manivela. Esta foi abase da indústria fonográfica. Com a popularidade do gramofone, o aparelho passou a integrar o mobiliário das salas da elite local. Numa crônica de 1908 surge uma pequena descrição do cotidiano de uma dessas casas, com boas doses de crueldade e ignorância: “Há poucas noites teve triste sorte uma agourenta coruja.
Todas as noites, quando na residência de um nosso amigo fazia se exibir um gramofone a ave agourenta empoleirada na cornija da janelae fazia alarde com seus pios, que causava calafrio aos transeuntes supersticiosos, entre eles passou alguém que disse: _ Credo! Abrenúncio, essa coisa que vá cantá no limbo. Mas, foi de pouca duração a exibição do mocho. Eram nove horas da noite, noite silenciosa, só se ouvia o soprar do vento fustigando com seu soproas árvores próximas, quando o estampido de um tiro veio tirar a vizinhança de sua monotonia. Uns punham o focinho para fora das janelas, outros abriam as portas para sindicar e perplexos perguntavam: O que foi? Morreu alguém?…Nesta perplexidade, viram o bicho na mão do Guaxenduva, que triunfante agitava a pobre coruja esfacelada pelo certeiro tiro que fez calar o côroco-cô-co, dizendo: Cante agora se for capaz! Por final atirou-a no capinzal próximo a Fábrica.
Assim finalizou a vida da pobre coruja! ”Pouco tempo depois o gramofone estava mais popular ainda e passou a ser vendido na própria cidade. Um anúncio de 1913, nas páginas do jornal “O Atibaiense”, estampava um vistoso “reclame” com direito a um clichê exclusivo que dizia: “Dante Battarello, ao Regulador Veneto” (Regulador era como se referiam aorelógio, e Veneto o nome da loja). Abaixo vinha o endereço: “Rua José Alvim – Atibaia” (Notem que não havia o número. Informação desnecessária naquela época em razão das poucas lojas comerciais existentes). Logo depois vinha um clichê reproduzindo o desenho a traço de umenorme gramofone ocupando quase todo anuncio e logo abaixo os dizeres: “Grande sortimento de Gramophones Columbia, e mais de 500 discos dos melhores autores do mundo”.Uma curiosidade em relação ao tema vem daquela imagem de um cachorro ouvindo um gramofone.
No google achei a história. Trata-se de um cãozinho chamado Nipper, que após a morte de seu primeiro dono acabou sendo adotadopeloirmão do dono. Junto com o cãozinho veio um fonógrafo cujo cilindro reproduzia a voz do falecido. Toda vez que ele era acionado o cãozinho Nipperse postava a frente do aparelho e ficava atento e saudoso ouvindo a voz de seu antigo dono. Foi a partir desta observação que surgiu a ideia de retratar numa pintura a imagem de Nipper ouvindo atentamente a voz de seu antigo dono. O quadro chamou-se “His Master’sVoice”. Tempos depois o quadro foi alterado, trocando o fonógrafo por um gramofone, e vendido para The GramophoneCompany, que acabou transferindo os direitos de uso da imagem e do slogan “His Master’sVoice” (O dono da voz) para a Victor TalkingMachineCompany, em 1901. A partir de então, Nipper passou a ser presença constante em toda a propaganda dos discos Victor e, posteriormente, nos da RCA Victor. Naquele tempo ouvir a voz de alguém, que não estava presente, era motivo de curiosidade para a grande maioria da população mundial, não apenas para um cãozinho, daí a razão dessa imagem ter se transformado num dos maiores ícones visuais do inicio do século XX.

* Márcio Zago é artista plástico, artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”.
Criador e curador da Semana André Carneiro.