E o teatro de Atibaia ilumina a Igreja Matriz…

Marcio Zago

No dia 25 de dezembro de 1907, no salão do Paço Municipal (hoje Museu Municipal João Batista Conti), o vigário Juvenal Kolly iniciava a cerimônia de inauguração da luz elétrica de Atibaia. Depois de inúmeros oradores, incluindo vereadores, convidados e demais autoridades, o Major Juvenal Alvim – Presidente da Câmara recebeu do engenheiro da Empresa Bragantina de Eletricidadea permissão para abrir o registro geraldo serviço… E fez-se a luz! Ainda sob o impacto do “deslumbrante efeito das inúmeras lâmpadas colocadas no salão” o grupo, em efusiva inspeção, deixou a Câmara em direção à rua, modernamente iluminadas pela primeira vez. A despeito da importância do momento, fatos polêmicos marcaram a data.
Um deles registrava o questionamento de alguns moradores em relação ao baile ofertado no Clube Recreativo. Os organizadores alertavam tratar-se de uma iniciativa particular, promovido por “variados rapazes da melhor sociedade” e não da Câmara, como diziam alguns. O mesmo não se deuem relaçãoàfarta distribuição de chopesque ocorreu após a inauguração… Esse sim, por iniciativa da Câmara. Outra polêmica ocorreu em função de um discurso proferido na cerimônia de inauguração (citada acima) quando o acadêmico Waldemar Ferreira, num momento de extrema infelicidade professa que “a eletricidade é nascida do pecado, no dia em que Eva comeu a maça proibida, razão pela qual a luz elétrica nunca pode penetrar nas igrejas para que os espíritos, no recolhimento, não sintam a tentação da grande luz”.
Por coincidência, ou vingança habilmente arquitetada pelo acaso, foi justamente o teatro, que muitos consideravam o palco sagrado da “tentação da grande luz”, que iniciou a campanha para iluminar nossa centenária igreja da Matriz. Foi do teatrinho da cidade que saiu a primeira iniciativa de promover uma campanha para arrecadar recursos para sua iluminação.
Para isso 25 lâmpadas elétricas foram instaladas no teatrinho,cedidas pelaEmpresa de Eletricidade. Com esse grande atrativo foi anunciado com pompa e circunstância à realizaçãoda peça teatral “Casado com a Sogra”, “chistosa” comédia em três atos de Xavier M. Na divulgação o destaque foi para a estreia da eximia e aplaudida artista Elvira de Camilli, que veio de fora para integrar o elenco. A peça foi apresentada pelo recém-criado Grupo Dramático de Amadores, tendo à frente Calixto Rinaldi. Integravam o elenco: Vicente Lauriano; E. Malozzi; Alfredo André; B. Pierrotti; J. Pires Oliveira; José Carlos Uff, José P. Silva e as senhoritas Elvira Camilli e Magdalena P. A banda local, regida pelo maestro Salles Bastosa companhou o espetáculo.
Pela primeira vez o teatrinho da cidade deixava para trás as velhas lanternas de querosene e as lâmpadas de acetileno do empresário Ettore Carrieripara entrar na modernidade da luz elétrica. Luz que passou a integrar outros elementos cênicos de nosso teatrinho. A apresentação foi um sucesso e pôde ser contabilizado nos cento e oitenta e um mil réisentregues ao Padre Kolly que, acrescidas de outras contribuições da comunidade, cobriram os custos da instalação. Finalmente, no dia 30 de maio de 1908, foraminauguradas as duzentas e cinquenta lâmpadas elétricas da Igreja Matriz. E assim o teatrinho de Atibaia, o templo da “tentação da grande luz”, minimizou a escuridãode nosso maior templo religioso, iluminando os caminhos da fé.

Márcio Zago é artista plástico e artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”. É criador e curador da Semana André Carneiro.