O Cine Republica em Atibaia
O Cine República foi o que mais marcou a memória dos cinéfilos locais, até o surgimento do Cine Itá.
Márcio Zago
Quem passa pelo calçadão de Atibaia, na Rua José Alvim, talvez não saiba que ali existiu o primeiro cinema da cidade: o Pavilhão Recreio Cinema. O estacionamento que hoje ocupa o local em nada lembra o luxuoso edifício em estilo Art Nouveau, construído pelo empresário Deoclides Freire em 1911.
Mais tarde, o cinema mudou de dono, passando a se chamar Palace Theatre, até ser adquirido pelo Major Juvenal Alvim e se transformar no Teatro República, ou Cine República, como ficou eternizado. Embora outros cinemas já tivessem existido em Atibaia, o Cine República foi o que mais marcou a memória dos cinéfilos locais, até o surgimento do Cine Itá, nos anos cinquenta, e dos cines Paraíso e Atibaia, nos anos sessenta.
Suas histórias eternizaram personagens, funcionários e acontecimentos que ainda vivem no imaginário dos moradores mais antigos. Sobre o nome, há controvérsias. Cinco anos antes da inauguração do República em Atibaia, foi inaugurado na capital paulista, na Praça de mesmo nome, o Cine República, considerado por muito tempo o melhor cinema de São Paulo. Sua suntuosidade e inovações tecnológicas, como a maior tela do mundo na época, chamavam atenção.
Gilberto Sant’Anna, no livro Atibaia – Histórias, escritos e prosas, sugere que o nome do Cine República atibaiense, embora pudesse remeter ao regime político implantado em 1889, acabou sendo mais associado à distribuidora de filmes Republic Pictures, devido à águia que ambos utilizavam como símbolo. Contudo, ele ressalta que a Republic Pictures só foi fundada em 1935, ou seja, após a inauguração do cinema de Atibaia. Essa águia, que Naile Sabbag em seu livro de memória, diz ter sido adquirido na Argentina pelo José Pires Alvim, o Zezico Alvim, pode ser considerada uma eficiente representações simbólicas da época.
Dá para imaginar o encantamento que a águia de asas abertas pousada no frontispício do prédio causava às crianças daquele período. Medindo sessenta centímetros de altura e um metro de envergadura a águiaficou “grudada” na memória de muitos atibaienses que associavam a bela escultura a momentos de grandes prazeres vividos em companhia de Tarzan, Zorro, Nioka, Flash Gordon, Tom Mix, Roy Rogers,Hopalong e tanto outros personagens que povoaram a imaginação de gerações e gerações de crianças e marmanjos pelo mundo afora.
Além de exibições cinematográficas, o Cine República também acolhia apresentações teatrais, musicais, conferências e outras atividades culturais que demandavam um espaço amplo. Depois da glória inicial o Cine República sucumbiu às mudanças sociais e tecnológicas que vieram com o desenvolvimento da cidade. Extinto nos anos sessenta, ele deixou um vazio físico e sentimental em muitos atibaienses. Sua demolição, assim como a de outros prédios históricos como a antiga fábrica, apagou um pedaço importante da história da cidade. Como observou o pesquisador José de Anchieta, o desaparecimento do Cine República é um legado das “garras afiadas do progresso, movido pela ganância” e acrescento, pela fome da especulação imobiliária, que sempre foi implacável no município. Atibaia, que já é bela, seria ainda mais encantadora se tivesse preservado ao menos parte de suas edificações mais antigas. A perda, lamentavelmente, é de todos.
* Márcio Zago é artista plástico, artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”.
Criador e curador da Semana André Carneiro.