A Festa de 13 de maio
No passado o dia 13 de maio era comemorado em muitas regiões brasileiras, tanto pela comunidade negra, como pelos abolicionistas e simpatizantes.
Márcio Zago
Ao assinar a Lei Áurea, em 1888, a Princesa Isabel aboliu a escravatura no Brasil. Isso que a geração mais antiga aprendeu nos bancos escolares. Comemorada por anos, a data é hoje justificadamente revista pela comunidade negra em razão da parcialidade da narrativa.
Atualmenteo dia 20 de novembro, Dia Nacional da Consciência Negra, é que simboliza as ações que avaliam a situação do negro no Brasil. Esta nova data foi escolhida em razão de ser o dia da morte de Zumbi dos Palmares, o grande líder da resistência negra e de sua luta pela liberdade. Zumbi é autor da frase: “Nascer negro é consequência, ser negro é consciência”.
No passado o dia 13 de maio era comemorado em muitas regiões brasileiras, tanto pela comunidade negra, como pelos abolicionistas e simpatizantes. No jornal “O Atibaiense”, as primeiras citações a respeito do dia 13 de maiosurgiram em 1906, quando o jornal publicou uma matéria enaltecendo a data e trazendo a Lei Áurea na íntegra. Em 1911 Clodomiro Palhares publicou um longo artigo colocando em ordem cronológica os eventos que antecederam a abolição. Depois disso, em 1914, outro artigo registrouos eventos oficiais que ocorreram na cidade inserindoo dia 13 de Maio nas comemorações escolares, fato que passou a ser frequente.
Neste evento a cidade recebeu o então deputado estadual Júlio Prestes para palestrar sobre o tema. Mais tarde Júlio Prestes foi eleito Presidente do Brasil pelo voto popular, mas impedido de tomar posse. Como se nota, a abolição da escravatura era aceitapela elite local, mas não havia quaisquer informações sobre a presença do próprio negro nos eventos que promoviam. Percebe-se que havia duas situações: uma relativa às comemorações oficiais, que eram devidamente registradas nas páginas dos jornais, e outra que ocorria a margem da oficialidade, de cunho estritamente popular.
Sobre esta última os integrantes mais antigos das congadas locais (até recentemente), ainda traziam narrativas sobre essa festa que deixou de acontecer há muito tempo. A primeira citação do jornal sobre a presença do negro nas festividades só ocorreu em 1924, quando “O Atibaiense” publicou: “No dia 13 de maio os nossos homens de cor, por iniciativa do popular Nhô Caetano, festejarão condignamente a gloriosa data da lei Aurea. No dia 12, à noite, no Pavilhão Central, haverá exibição da dança dos cayapós pelo grupo Guarany, devidamente caracterizados, começando às 20 ½ horas. Dia 13, alvorada pelos Cayapós. Às 11 horas missa solene em louvor a S. Benedito na Igreja do Rosário. Após a missa o grupo percorrerá as ruas da cidade exibindo suas danças e cantigas. O grupo espera do público um auxilio, bem como a entrada no Pavilhão será de 1$200”.
Nota-se neste artigo, pela primeira vez, o pedido de uma ajuda de custo para um grupo ligado à cultura popular, fato incomum em nossa cidade. Não há como citar o “13 de Maio” em Atibaia sem mencionar o nome de Antônio Bento, que atuou como Juiz municipal entre 1871 a 1874. Por seus ideais abolicionistas travouuma luta ferrenha contra os liberais da época, sofrendo um atentado a tiro em 1873, fato que gerou um longo processo judicial e seu afastamento da cidade.
Com sua ausência ficou inacabado um prédio que pretendia utilizar comoo primeiro hospital de Atibaia.Anos depois o prédio abandonado foi reformado e transformado em Mercado Municipal, dividindo esse ambiente com um pequeno espaço cênico: O Teatrinho do Mercado, um importante marco cultural daquela longínqua virada do século XIX.
O nome de Antônio Bento figura ao lado de abolicionistas ilustres como Luís Gama, José do Patrocínio, André Rebouças, Rui Barbosa e outros, mas aqui na cidade pode ser associado também (de forma indireta) ao surgimento do teatro em Atibaia. Durante muitos anos, mesmo após sua morte que ocorreu em 1898, sua casa em São Paulo recebeu inúmeras pessoasno dia 13 de maio para comemorar a data com animados batuques. Era o reconhecimento ao trabalho que prestouem favor dos negros escravizados.
* Márcio Zago é artista plástico, artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”.
Criador e curador da Semana André Carneiro.