Atibaia recebe Vicente Celestino no Cine República

Em 1941, Atibaia recebeu um dos maiores artistas desse período: o cantor e compositor Vicente Celestino.

Márcio Zago

A partir dos anos 1930, o rádio conquistou o Brasil e chegou até as pequenas cidades do interior. Em Atibaia, os ouvintes mais abastados podiam adquirir um rádio Telefunken nas lojas do Sr. Attílio Russomanno, que, suponho, mantinha o aparelho ligado por horas a fio para atrair a atenção da freguesia.
Nos anos 1940, surgiu na cidade a primeira retransmissora: a Rádio Propaganda de Atibaia, um serviço de alto-falante instalado no sobrado ao lado do Clube Recreativo, fundado pelo Sr. Dácio Scapim. Além de retransmitir a programação das rádios existentes, como a Mayrink Veiga e a Nacional, o serviço incluía anúncios do comércio local e músicas que animavam o footing que sempre ocorria na Praça da Matriz — tornando-se um elemento essencial da vida social atibaiana.
O rádio não apenas encurtou distâncias, aproximando os ouvintes dos grandes centros culturais, como também transformou cantores em ídolos nacionais. A popularidade e os recursos financeiros desses artistas vinham também das excursões pelo país, levando suas vozes aos mais distantes palcos.
Em 1941, Atibaia recebeu um dos maiores artistas desse período: o cantor e compositor Vicente Celestino. Quando se apresentou no Cine República, sua voz potente já ecoava há muito tempo pelas casas, salões e praças da cidade. Reinando absoluto desde a década de 1920, quando iniciou uma das mais longas e brilhantes carreiras da música brasileira, Celestino tornou-se um dos maiores expoentes da chamada Era de Ouro da música nacional, figurando ao lado de cantores como Mário Reis e Francisco Alves.
O recital no Cine República aconteceu em uma terça-feira de 1941 e, apesar de ser um dia de semana, o teatro esteve lotado. Acompanhado pelos violonistas Luiz Bittencourt e Laurival de Moraes, Vicente Celestino interpretou sucessos consagrados de seu repertório, como Patativa, Rasguei o Seu Retrato, Papai Noel, Serenata, Coração Materno, O Ébrio e outras. Seu acompanhante Luiz Bittencourt também já era conhecido do grande público por composições como Lua Triste, gravada por Sílvio Caldas em 1936. O cinema também impulsionou a carreira de Vicente Celestino.
O Ébrio, filme que se tornaria um dos maiores sucessos da história do cinema brasileiro, foi lançado alguns anos após sua passagem por Atibaia. Estima-se que tenha alcançado um público de cinco milhões de espectadores nos primeiros quatro anos de exibição. O filme foi dirigido por sua esposa, Gilda de Abreu, e antes de chegar às telas, a história — inspirada em uma canção do cantor — já havia sido encenada no teatro. A popularização do rádio abriu caminho para inúmeros artistas que passaram a percorrer o país, levando arte e cultura a espectadores que, de outra forma, dificilmente teriam a oportunidade de ver seus ídolos de perto.

* Márcio Zago é artista plástico, artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”.
Criador e curador da Semana André Carneiro.