A propaganda é a alma do negócio…
Márcio Zago
A partir de outubro de 1912 Atibaia passou a ter duas casas de exibições cinematográficas com a inauguração do Popular Cinema, do empresário Hilário de Vasconcelos. Provisoriamente o Popular (como ficou conhecido) passou a funcionar no Teatrinho do Mercado.
A primeira casa de exibição foi o Pavilhão Recreio Cinema, do empresário Deoclides Freire, que nessa data já funcionava em sede própria na Rua José Alvim. Com dois cinemas na cidade a disputa pelo limitado público da época ficou acirrada. No jornal “O Atibaiense”, ao contrário da previsão, ocorreu uma visível retração na divulgação do Pavilhão Recreio Cinema com a chegada do Popular.
As matérias a respeito do novo cinema passaram a ganhar tamanho cada vez maior, com conteúdos fortes e até desleais em relação ao concorrente.Se comparado às demais matérias do jornal percebe-se que o texto era produzido por alguém sem o total domínio da escrita, supondosua autoria ao próprio Hilário de Vasconcelos. Na época tudo era novidade, até a propaganda (ou reclame como era nomeada). A frase “A propaganda é a alma do negócio”, atribuída à Zoraide Franco, viraria bordão entre os publicitários muito tempo depois, mas seu conteúdo já era intuitivamente entendido e empregado pelos proprietários dos cinemas.
Enquanto no Pavilhão Recreio Cinema, Deoclides Freire ganhava fama como “reclamista”, no Popular o empresário Hilário de Vasconcelos buscava a sua maneira de chamar a atenção do público. O bordão “é sensacional, é belíssimo, é supimpa!”, proferido pelo Deoclides Freire nos intervalos das sessões “viralizaram” na época, obrigando Hilário de Vasconcelos a se desdobrar na tentativa de igualar-se ao concorrente. E valia tudo.
Num dos artigos escreveu: “Para hoje está organizado um programa especial, para o qual chamamos a atenção do público ilustrado e de bom gosto. Cremos que é um espetáculo excepcional. Estamos resolvidos a emprestar os termos superlativos de certo reclamista desta cidade, aumentando-os ainda no seu auge até chegar à ponta da haste da lua para assim poder igualar a merecida e valorosa escolha dos filmes que hoje serão exibidos no Teatro Popular…” Além dos textos “ácidos”, cutucando o concorrente, também tinha a versão poética da divulgação:
Disseste bem, ó Nordisk
Quinta feira na “Cidade”
Sucesso do Popular
Proclamaste com verdade.
Hoje como prova disso
Seu programa é sem rival:
Pois além das fitas boas
Tem um drama policial.
Ressureição de Nick Winter
Seu nome é como se vê…
Tem 3 partes, 2 kilometros
É da afamada “Pathè”.
Este famoso Nick-Winter
É detetive sem par
Venha todos conhecê-lo
Venham hoje ao Popular.
E aqui cabem algumas anotações: O “Nordisk”, que aparece no início do poema é referente à Nordisk Film, uma empresa de produção cinematográfica fundada 1906. Na época era comum divulgar de qual produtora era o filme e ser exibido. A palavra “Cidade” que surge em seguida é a sobre o jornal “A Cidade”, fundado no mês anterior por Alfredo André e que trazia matéria sobre o Popular Cinema. Outra característica da época era divulgar em quantas partes era dividido o filme (para saber quantas trocas de rolos seriam realizadas), além da informação sobresua metragem (para prever sua duração). O “Pathè” que aparece na poesia também é umaempresa de produção cinematográfica. Por fim surge uma referencia ao filme “La résurrection de Nick Winter”, famosa série de detetive do tempo do cinema mudo.
* Márcio Zago é artista plástico, artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”.
Criador e curador da Semana André Carneiro.