Consciência Negra e o jornalismo de excelência
Uma “proposta inconstitucional”. A “destruição de direitos adquiridos”. Algo desumano, que deixaria “expostos à miséria e à morte os inválidos, os enfermos, os velhos, os órfãos e crianças abandonadas da raça que se quer proteger”. Foi assim que em 12 de maio de 1888, um dia antes da aprovação da Lei Áurea no país, senadores da bancada escravagista no Senado justificaram suas posições contrárias à legislação que extinguiria a escravidão.
O repórter Gil Alessi, do grande jornal El País, recuperou essa sessão do Parlamento, que mostra como alguns deputados abolicionistas também cometeram erros ao traçar um panorama do que viria com o fim do regime escravocrata no Brasil. “A escravidão será em poucos anos apenas uma sombra no passado, sem perturbar com desastres e ruínas as alegrias do futuro”, afirmou Manoel Francisco Correia, do Paraná, em palavras que, vistas à luz da situação de discriminação, racismo e violência que o negro ainda sofre no Brasil do século XXI, não poderiam soar mais equivocadas.
Cento e trinta e um anos se passaram desde esta discussão, que culminou na abolição da escravidão, mas o Brasil ainda está longe de ser uma democracia em termos raciais. Na edição especial sobre o Dia da Consciência Negra, a repórter Heloísa Mendonça, do El País, percorreu os dados do presente, que deixam claro as marcas de três séculos de escravidão que persistem até os dias de hoje no país. Em 2017, 50,7% das crianças até cinco anos que morreram por causas evitáveis eram pardas e pretas, enquanto 39,9% eram brancas.
Em 2018, a taxa de analfabetismo das pessoas pretas ou pardas foi de 9,1% no Brasil, quase três vezes maior que a de brancos (3,9%). Pretos ou pardos também somam atualmente 64,2% da população desocupada do Brasil. Em 2017, uma pessoa preta ou parda tinha 2,7 vezes mais chances de ser vítima de homicídio intencional do que uma pessoa branca.
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