Esta novinha aí é uma criança
Anna Luiza Calixto
Acontece de fora para dentro: não é um processo natural ou parte do desenvolvimento transitório infantojuvenil. Não é “uma gracinha” ou “maduro” para a idade. A erotização de crianças e adolescentes é uma fagulha incandescente e adulta que infere no crescimento, capaz de ceifar parte essencial da infância e de produzir resultados catastróficos.
A menina de 7 anos calça os saltos da mãe e desfila em frente ao espelho com o batom vermelho borrado pelo rosto, fascinada pelo universo adulto e pelo glamour que ele estampa em vitrines coloridas.
Conhecer a si mesmo e brincar de crescer por alguns instantes não são determinantes nocivos para que uma criança tenha sua experiência infantil completa e intrínseca. Pelo contrário, são traços comuns da idade – aí vive a diferença latente entre a sexualização e a sexualidade.
A sexualidade, por sua vez, é um viés presente em todo e qualquer ser humano, inata, e que pode ser estimulada de maneira saudável, dentro do prisma do conhecimento pessoal, dos limites do próprio corpo e da familiaridade natural com o mesmo – saber onde dói e ser capaz de identificar a diferença entre o carinho e o abuso.
Já a sexualização é uma manobra adulta que, muitas vezes encabeçada pela publicidade infantil, faz com que aquela menina desfilando em frente ao espelho do closet da mãe já se preocupe com as medidas da silhueta, com o primeiro namorado e não se sinta à vontade para sair sem um pouco de pó nas maçãs do rosto.
O incentivo ao comportamento vulgarizado entre crianças e adolescentes nasce em atitudes aparentemente inofensivas, no estímulo a comportamentos adultos e na construção de cenários propícios para tanto. “E as namoradinhas?” ou “Como você fica linda vestida de gente grande!”, traçando um contato cada vez mais real com o mundo adulto e provocando uma postura cada vez mais distante da comum para a faixa etária.
Suja de terra ou com cheiro de pipoca doce, a infância precisa ser discutida. Qual o momento certo para falar de sexo? Qual a idade certa para começar a pintar as unhas e usar maquiagem? E sair sozinho? Gostar de alguém? Saber quem é de verdade? Conhecer o próprio corpo?
Não existe receita perfeita ou fórmula mágica. Cada criança tem seu modo e peculiaridades, pois se trata de um ser único. Certo é que seu espaço deve ser respeitado, dentro das condições naturais e das peculiaridades inerentes ao seu crescimento.
Se eu vou parar de brincar com minhas bonecas ou trenzinhos ao 7 ou aos 14, mamãe, deixe-me escolher. Está tudo bem. Eu não preciso já ter dado o meu primeiro beijo aos 13. Eu posso escolher saia rosa ou macacão de margaridas, eu sei quem sou, ou melhor, estou descobrindo.
Deixe que eles descubram, sem pressa, o que querem ser quando crescer.