HISTÓRIAS DE ATIBAIA – Você sabia que Atibaia tinha três cinemas nos anos de 1920

A partir de 1964 o município chegou a manter três salas de cinema funcionando simultaneamente. Poucos lembram, porém, algo semelhante já havia ocorrido décadas antes, nos anos 1920, quando a população era muito menor.

Márcio Zago

A partir de 1964, com a inauguração do Cine Atibaia, o município chegou a manter três salas de cinema funcionando simultaneamente: o Cine Atibaia, o Cine Paraíso e o Cine Itá — um feito notável para qualquer cidade do interior. Poucos lembram, porém, que algo semelhante já havia ocorrido décadas antes, nos anos 1920, quando a população era muito menor.
Em janeiro de 1926, o jornal O Atibaiense noticiava a inauguração de mais um elegante cinema em Atibaia: o Cine Trianon, localizado na Rua José Pires. A casa abriu as portas mesmo sem estar totalmente concluída, ainda faltando parte das poltronas. A pressa em iniciar as atividades talvez se devesse ao anúncio de outro empreendimento prestes a ser inaugurado: o Cine República. A diferença entre uma inauguração e outra foi de apenas vinte dias. Assim, Atibaia passou a contar com duas salas em funcionamento: o Cine Trianon e o Cine República.
O terceiro cinema ficava em Jarinu — à época distrito de Atibaia. Tratava-se do Cine D’Annunzio, um pequeno cinema de bairro com cerca de duzentos lugares, inaugurada em junho de 1926 pela Sociedade Italiana do Mútuo Socorro Gabriel D’Annunzio, fundada pelos imigrantes italianos da localidade.
O espaço da própria sede da entidade foi adaptado para receber as exibições. Sobre o Cine Trianon, propriedade da empresa Irmãos Titarelli, sabe-se que sua sessão inaugural exibiu o filme Sandra, dirigido por Arthur H. Sawyer e estrelado por Bert Lytel e Barbara La Marr. Apenas seis anos depois, em 1932, o espaço foi reformado e passou a também abrigar uma pista de patinação: o Rinck Trianon, cuja inauguração contou com a presença da Corporação Musical 24 de Outubro. A utilização de salas de cinema para outras atividades em horários ociosos já era prática comum desde os tempos do Pavilhão Recreio Cinema. Em 1934, o Trianon foi adquirido pela empresa Lourenço Bernini e rebatizado como Cine Para Todos.
Já o Cine República, de propriedade do major Juvenal Alvim, acumulou inúmeras histórias ao longo de suas cinco décadas de funcionamento. Mesmo após sua demolição, nos anos 1960, as lembranças continuaram vivas no imaginário de seus antigos frequentadores por muito tempo. Personagens como Tarzan, Zorro, Nioka, Flash Gordon, Tom Mix, Roy Rogers e Hopalong marcaram gerações que lotavam suas sessões. Mas não foram apenas as aventuras projetadas na tela que deixaram recordações: os feitos de Lázaro Chiochetti, do popular Abdala, as “overtures” conduzidas pelo maestro Moura, e até a imponente águia de asas abertas no frontispício do prédio compuseram a atmosfera inesquecível do cinema.
O Cine República também foi palco de disputas que ultrapassavam a arte e adentravam a política local. De um lado, os frequentadores do Cine Trianon, dos irmãos Titarelli, simpáticos ao Partido Democrático; de outro, os habitués do Cine República, ligados aos Alvim, que orbitavam entre o Partido Liberal e, mais tarde, o Partido Republicano. Essa rivalidade política dava ainda mais intensidade às histórias vividas dentro e fora da sala escura. Tempos em que Atibaia, mais que uma cidade, era uma comunidade com laços quase familiares entre seus moradores. Bem distante das relações impessoais que veio junto a seu inevitável crescimento.

* Márcio Zago é artista plástico, artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”.
Criador e curador da Semana André Carneiro.