O que NÃO é a educação sexual

Como romper estigmas para avançar nas escolas.

Anna Luiza Calixto

Não tem quase nada que me irrite tanto quanto ouvir alguém resumindo a educação sexual escolar no ensino da parte reprodutiva ou, pior, quando supõem que a educação sexual nas escolas erotiza as crianças e estimula a prática sexual dos adolescentes. Que história é essa, gente?
Educação sexual para crianças e adolescentes não é uma coisa só. Com isso quero dizer que a adaptação de conteúdo de acordo com a faixa etária é fundamental. Não faz sentido falar de quais são as partes íntimas no terceiro ano do Ensino Médio, assim como não tem nada a ver eu falar sobre métodos contraceptivos no jardim de infância. Deu pra entender? A educação sexual é uma prática que exige uma metodologia adaptativa às demandas e especificidades do público atendido.
Educação sexual não é falar sobre posições para a prática sexual, MUITO MENOS exibir filmes pornográficos em sala de aula. Muito pelo contrário: a educação sexual possibilita que adolescentes compreendam que a indústria pornográfica não tem compromisso com a verdade nem com a representatividade de corpos e vivências, sendo extremamente estereotipada e restrita a um nicho comercial bem específico para o qual ela desenvolve suas produções. .
Educação sexual não é emancipar a criança ou o adolescente a um status quo adultizado, mas respeita o que o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente chama de período de desenvolvimento peculiar na infância e adolescência. Há hora nessa vida pra tudo, já dizia o Rei Salomão. Então na primeira infância trabalhamos a identificação nominal de cada uma das partes íntimas e o direito de dizer não, assim como a importância de pedir ajuda para um adulto de confiança e o dever de respeitar o não dos coleguinhas e amigos. Conforme o sujeito de direitos cresce, vamos aprofundando as temáticas de acordo com suas vivências. O que não dá é pro marmanjo sair do terceirão tendo decorado o ciclo de reprodução das samambaias pro vestibular e não fazer ideia de como funciona o ciclo menstrual feminino além do básico do básico do básico sobre a janela de ovulação.
Por fim: educação sexual não vai expor os adolescentes a riscos. Um levantamento de alguns anos atrás da UNICEF revela que quanto mais cedo um adolescente é informado sobre sua dignidade sexual, mais tarde ele terá suas primeiras relações sexuais e quando rolar vai ser protegido. “Ah, Anna, mas eu não quero falar porque incentiva!” – gente, o que incentiva é a curiosidade de quem lida com a sexualidade desde o berço como um assunto proibido, sujo e pecaminoso. Quando a gente conduz o tema de forma segura, consciente e responsável, não tem mistério.
Educação sexual trabalha a autorregulação emocional; a noção do consentimento e do respeito a si; ao mundo e ao outro; a valorização da identidade através do fortalecimento da autoestima; o conhecimento do próprio corpo; a importância de denunciar quaisquer violações à sua dignidade sexual e procurar um adulto da sua confiança; autonomia corporal; afetividade respeitosa… Enfim: educação sexual e autoproteção são práticas maravilhosas que libertam nossos meninos e meninas dos ciclos que tendem a perpetuar as violências. Cada um e cada uma de nós que convive com eles e elas tem que começar a corrigir o comportamento sexista e patriarcal regido por pensamentos como o fatídico “Prendam suas cabritas que o meu bode tá solto.” Ensinem os bodes a não atacarem as cabritas e a paz vai reinar no curral, eu garanto a vocês.