Carnaval e Revolução de 1932
Sabemos hoje que meses depois deste Carnaval de 32, mais precisamente em 09 de julho, explodiria a chamada Revolução Constitucionalista.
Márcio Zago
Em 1931, o Carnaval de Atibaia foi marcado pelo desânimo e pelo fraco envolvimento dos brincantes. Em 1932, pior ainda. O clima pesado vinha da política, que não favorecia os arroubos carnavalescos de uma cidade que, normalmente, já demonstrava pouco entusiasmo pelo tema. Naquele ano, em particular, a preocupação dos paulistas caía sobre o futuro do país, fato que não dava espaço para o clima festivo e descontraído do reinado de Momo.
Sabemos hoje que meses depois deste Carnaval de 32, mais precisamente em 09 de julho, explodiria a chamada Revolução Constitucionalista, um movimento armado liderado pelo Estado de São Paulo, que defendia uma nova Constituição para o Brasil e atacava o autoritarismo do Governo Provisório de Getúlio Vargas.
Atibaia aderiu ao movimento e se envolveu de corpo e alma nessa causa. Não havia clima para o Carnaval. Em nota, “O Atibaiense” publicou: “(…) A mocidade atibaiense, que prima pela falta de expansibilidade, a viver num interminável “encorujamento”, não quis, neste ano da graça de 1932, nem ao menos organizar os tonitruantes Zé Pereiras que, com suas notas retumbantes, anunciavam aos quatro cantos, com alguma antecedência, o efêmero reinado de Momo em terras atibaianas, para consolo e alegria de todos nós, nestes bicudos tempos de crise e agitações políticas… (…)” Naquele Carnaval, a diversão ficou restrita aos bailes organizados pelo Clube Operário, pela Associação do Comércio e pelo Clube Recreativo, tendo como animadores a banda “Jazz República”, formada por músicos locais. Não houve cordões, guerras de confetes, serpentinas e nem mascarados pelas ruas.
O corso, com seus barulhentos carros de escapamento aberto (uma moda na época), também não desfilou pelas ruas. A concentração de pessoas só ocorreu nas sessões cinematográficas do Cine República e do Cine Trianon, cuja programação em nada lembrava o reinado de Momo. Foi um Carnaval frio e comemorado exclusivamente pela elite econômica atibaiana. O poder público até tentou animar os populares, pagando uma apresentação musical da Corporação Musical 1o de Março para tocar no coreto da matriz, fato que disfarçou, parcialmente, a monotonia reinante. E isso foi tudo. A partir de 09 de julho, com o início da Revolução, e pelos quatro meses seguintes, os paulistas entraram em confronto com tropas fiéis a Getúlio Vargas e, isolados, foram derrotados.
Naquele Carnaval de 32, parecendo antever o futuro, o jornal “O Atibaiense” publicou um poema assinado por Mirinha. De nome “Cinzas”, o poema dizia: “Quarta-feira de Cinzas… Serpentinas desfeitas… Farrapos de Carnaval! Três dias de alegrias! Três dias de loucura! Guizos… Sorrisos… Delírios… Beijos… Carnaval! / Você me conhece? E o palhaço de olhos arregalados, de grossos lábios rubros e rosto caiado, revira-se todo e pergunta: Você me conhece? / Vida! Você me conhece? Não! Quem poderá adivinhar o que se passa bem dentro do meu eu? Quem poderá ler os meus pensamentos e escutar o meu coração? Vida! Cinismo! Vida! Hipocrisia! Eterno Carnaval! Você me conhece? Não! Ninguém me conhece! / Quarta-feira de cinzas! Serpentina desfeitas dos sonhos e das loucuras! Farrapos e alegria! Quarta-feira de Cinzas! Tédio… Amargura… Fadiga… saudades…” O conflito armado deixou o tédio, a amargura, a fadiga e a saudade para a grande maioria dos paulistas, mas nem tudo foi em vão.
Apesar da derrota, em 1934 foi promulgada a nova Constituição brasileira. Para muitos historiadores, este foi o fato mais relevante desse episódio e seus defensores alegam que foi um movimento “militarmente derrotado, mas politicamente e moralmente vitorioso”.