HISTÓRIAS DE ATIBAIA – O Museu da cidade tinha o seu sino
Quem entra no Museu Municipal João Batista Conti logo o vê, à direita: um velho sino, imóvel e silencioso, que repousa há anos.
Márcio Zago
O sino — esse instrumento sonoro tão familiar e, ao mesmo tempo, tão pouco utilizado na atualidade — teve origem na China há cerca de 3.000 anos antes de Cristo. Séculos depois, deixou de ser um instrumento pagão para ser incorporado aos rituais religiosos, tornando-se símbolo de fé e devoção. Sua fabricação é uma verdadeira arte. Ao longo do tempo, os fundidores aperfeiçoaram a composição dos metais, variando proporções, espessuras e formatos, o que conferiu a cada sino um timbre próprio, inconfundível.
Toda cidade de formação antiga teve seu momento de respeito e reverência a esse velho conhecido da humanidade… Em Atibaia não foi diferente. Ainda ressoam, de tempos em tempos, os sinos da Igreja Matriz, da Igreja do Rosário e das capelas de bairro que, embora mantenham viva a tradição, já não possuem a mesma importância de outrora. Mas há outro sino que marcou a história do município.
Quem entra no Museu Municipal João Batista Conti logo o vê, à direita: um velho sino, imóvel e silencioso, que repousa há anos. Esquecido hoje, ele já foi símbolo de autoridade e orientação para muitas gerações de atibaienses, que viam em seu som o guia de seus destinos. Instalado no campanário que existia no segundo andar do mesmo edifício — o qual abrigou, em outros tempos, a Câmara e a Cadeia Municipal —, o sino manteve-se em seu posto até a última grande reforma do prédio. Sua função estava registrada no primeiro Código de Posturas Municipais, de 1893.
Entre suas atribuições, cabia-lhe anunciar o toque de recolher. Esse costume, herdado das antigas ordenações de inspiração católica, determinava que, após as nove horas da noite, ninguém deveria permanecer nas vias públicas — salvo em dias de festa, quando a tolerância se estendia até as dez. O comércio também devia respeitar o toque: quem mantivesse as portas abertas além do horário poderia ser multado em dez mil réis, excetuando-se farmácias, bilhares e padarias que não vendessem bebidas alcoólicas.
O sino também regulava a rotina comercial da cidade: às quatro da tarde dos domingos e às oito da noite nos dias de semana, seu som anunciava o fechamento obrigatório das lojas. Eram tempos em que os dias corriam pachorrentos entre o canto dos pássaros e o murmúrio dos ventos. A luz do sol e da lua marcava o acordar e o dormir, e as noites eram silenciosas, interrompidas apenas pelo pio distante da suindara. Hoje, ninguém mais ouviria o toque do sino que um dia ditou a rotina da cidade. O som que antes impunha silêncio e recolhimento foi substituído pelos ruídos dos carros, buzinas, freadas, anúncios e músicas de todo estilo e volume. Aquele sino, outrora instrumento de ordem e autoridade, tornou-se o símbolo de outro tempo — um tempo em que o ritmo de vida era ditado pela natureza, e não pela pressão social do sistema econômico e pelo andar acelerado e vazio da vida moderna.
* Márcio Zago é artista plástico, artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”.
Criador e curador da Semana André Carneiro.



