HISTÓRIA DE ATIBAIA: O Atibaiense, um espelho do cotidiano da cidade
Márcio Zago
Em 1943, o jornal O Atibaiense publicou o que parecia ser uma coluna de caráter permanente intitulada “Tesourando”. Composta por diversos subtítulos e ocupando quase uma página inteira, a coluna oferecia um retrato preciso da imprensa local daquele período — algo que hoje chama a atenção pela peculiar proximidade com seus leitores.
Os artigos, com frases curtas e objetivas, não escondiam tratar-se de uma ação entre amigos, direcionada a um pequeno círculo de pessoas influentes na sociedade da época. Eram brincadeiras, gozações e fofocas ligadas a namoricos, brigas e feitos de um grupo restrito. Vale lembrar que a população de Atibaia, naquele período, não chegava a 18 mil habitantes, sendo boa parte não alfabetizada.
Outros artigos reforçam a ideia de que a cidade era uma pequena comunidade onde todos se conheciam onde o jornal, além de porta-voz desse grupo, tinha a função de preservar sua integridade. É o caso do artigo “Veranistas…”, publicado no mesmo ano. Trata-se de uma crítica aos inúmeros turistas que frequentavam a cidade e que nem sempre se portavam de forma condizente com os padrões sociais da época: “(…) Um ou outro, metido a engraçadinho, julga estar num lugarejo muito atrasado, onde não deva respeito às convenções sociais. Ainda nos dias da Semana Santa, dois ‘granfos’ duvidosos andaram pelas ruas da cidade exibindo-se em calcinhas esporte indecorosas, a ponto de serem advertidos pela polícia.” Ou ainda o artigo “Namoros Escandalosos”: “Inúmeras são as queixas das famílias sobre os namoros inconvenientes que se observam nas esquinas e jardins da cidade. Nos jardins, principalmente, esses idílios assumem aspecto escandaloso, reclamando, pois, providência de quem é de direito.” Outros exemplos não faltam como as matérias queixosas referentes aos cavaleiros da época que faziam das ruas centrais um verdadeiro hipódromo, ou ainda as reclamações sobre as bombinhas e traques que a gurizada lançava na entrada do Cine República para assustar o público entretido na tela.
A leitura dessas páginas revela O Atibaiense como um espelho do cotidiano atibaiense — um registro não apenas dos fatos, mas também das expectativas e anseios de uma comunidade; um formador de opinião e guardião dos valores locais. Revisitar esses textos, um privilégio que tenho desde 2021, é reencontrar a pulsação de uma Atibaia que ficou no passado — fato que reforça sua importância como patrimônio cultural fundamental para a construção da memória e da identidade comunitária de nossa cidade.
* Márcio Zago é artista plástico, artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”.
Criador e curador da Semana André Carneiro.



