A PEC do Fim da Jornada 6×1: Um Passo Atrás no Caminho do Progresso
Qualidade de vida dos trabalhadores é, sem dúvida, um objetivo essencial e legítimo.
Por André Marques*
Em um momento de constantes mudanças nas relações de trabalho, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que propõe extinguir a jornada de trabalho 6×1 e reduzir a carga semanal para 36 horas suscita debates acalorados. Embora apresente promessas como a melhoria da qualidade de vida, aumento da produtividade e geração de empregos, é necessário analisar de forma crítica os potenciais impactos dessa proposta. Ao que tudo indica, a PEC pode trazer mais prejuízos do que benefícios para a economia brasileira e para o ambiente empresarial.
A qualidade de vida dos trabalhadores é, sem dúvida, um objetivo essencial e legítimo. Contudo, questiona-se se o fim da jornada 6×1 é o caminho mais eficaz para alcançá-lo. Em um país com altas taxas de desemprego, muitos trabalhadores enxergam a possibilidade de jornadas contínuas como uma oportunidade de garantir renda e estabilidade, ao invés de um ônus. A redução da jornada, ao restringir a disponibilidade de trabalho, pode impactar negativamente a empregabilidade em setores que demandam alta flexibilidade operacional.
Além disso, o argumento de que a redução da jornada aumenta a produtividade carece de sustentação sólida. Um exemplo emblemático é o caso da França, que em 2000 reduziu a semana de trabalho para 35 horas. A expectativa era de que a mudança impulsionasse a produtividade e reduzisse o desemprego, mas os resultados foram decepcionantes. A produtividade não apresentou um aumento significativo, e as taxas de desemprego permaneceram elevadas, forçando o país a flexibilizar a legislação nos anos subsequentes.
No mesmo sentido, a Alemanha também experimentou políticas de redução de jornada, como o Kurzarbeit em momentos de crise, mas os resultados positivos ocorreram apenas devido à flexibilidade setorial e à adaptação cautelosa das regras. A criação de empregos massivos, que era um dos objetivos primários, foi limitada, evidenciando que o impacto no mercado de trabalho não é direto nem garantido.
Outro aspecto preocupante é o impacto financeiro sobre as empresas brasileiras. O aumento dos custos operacionais, especialmente em setores que exigem operação contínua, pode ser um desestímulo para investimentos e levar ao repasse desses custos para o consumidor. O Brasil, que já enfrenta desafios significativos para manter sua competitividade no mercado global, não pode arcar com medidas que elevem ainda mais o custo de produção e comprometam sua inserção no comércio internacional.
Por fim, o desafio da implementação dessa PEC também merece destaque. A mudança estrutural na jornada de trabalho exigirá tempo, recursos e um planejamento detalhado. Empresas, especialmente pequenas e médias, que são a base da economia brasileira, podem não estar preparadas para arcar com os custos dessa transição. Além disso, é provável que a alteração gere litígios trabalhistas, complicando ainda mais o ambiente jurídico e empresarial.
A história nos ensina que políticas públicas baseadas em boas intenções, mas mal planejadas, muitas vezes resultam em efeitos adversos. A experiência de países como França e Alemanha demonstra que a redução da jornada, por si só, não é uma solução milagrosa. No Brasil, a adoção dessa medida sem uma análise detalhada dos impactos pode representar um retrocesso em vez de um progresso.
Portanto, é essencial que o debate sobre a PEC seja conduzido com equilíbrio e seriedade, buscando soluções que conciliem a qualidade de vida dos trabalhadores com a sustentabilidade econômica das empresas. Mais do que nunca, é preciso ponderar: estamos realmente prontos para um passo tão ousado? Ou seria mais sensato investir em medidas que promovam a modernização das relações de trabalho de maneira gradual e responsável?
*Por André Marques, advogado, mestrando em direito empresarial, especializado em governança assessoria jurídica empresarial e especialista em direito tributário.