Circus Recorde e o globo da morte

O globo da morte foi criado nos EUA por volta de 1900, logo após a invenção da motocicleta.

Márcio Zago

Nos anos 1940, a região de Bragança já havia recebido inúmeras companhias e artistas circenses que hoje fazem parte da historiografia do circo. Em 1939, foi a vez do Circus Record montar sua lona no Largo da Máquina, localizado na região onde hoje se encontra a rodoviária. O local recebeu esse nome por abrigar a máquina de beneficiar café do Major Juvenal Alvim. Normalmente, os circos que chegavam a Atibaia se instalavam no pátio do mercado ou na Praça Miguel Vairo, tornando o Largo da Máquina uma novidade para essas apresentações. Uma das atrações mais notáveis do CircusRecord era o globo da morte, uma jaula esférica de aço onde motociclistas, conhecidos como “globistas”, corriam pelo seu interior.
O globo da morte foi criado nos EUA por volta de 1900, logo após a invenção da motocicleta. Em Atibaia, era a segunda vez que o público assistia a esse espetáculo, mas desta vez com a presença do artista que trouxe o número para o Brasil: o engenheiro italiano Guido Conci, proprietário do CircusRecord. Nesta apresentação, ele estava acompanhado dos artistas Renol e Genny, cujo nome verdadeiro era EugenieHundadze, uma artista russa e esposa de Conci. Genny foi a primeira mulher globista do Brasil.
O anúncio do Circus Record publicado no jornal não teve grande destaque. As crônicas do jornal “O Atibaiense” que marcaram as duas primeiras décadas do século XX já não eram frequentes nos anos 1940. No entanto, caso ainda existisse, é provável que seus colunistas tratassem do tema, dado o impacto causado no público por essa atração inusitada.
Pode-se imaginar a reação da plateia boquiaberta diante da gaiola de aço, somada ao som estrondoso das motocicletas, enquanto se perguntavam como os pilotos conseguiam permanecer girando e até correr de cabeça para baixo sem cair do teto da estrutura metálica. Sabemos que tudo está relacionado à física, onde a força centrípeta e a inércia mantêm as rodas dos veículos coladas ao globo, impedindo que os pilotos caiam. Para o público em geral o espetáculo era mágico, inusitado e extremamente impactante.Além do Globo da Morte, o CircusRecord anunciava uma variedade de outras atrações. Entre elas estavam “Os Quatro Diabos Vermelhos”, a intrigante “Mulher Serrada” e o emocionante “Índio Mexicano com suas Facas Diabólicas”.
O espetáculo contava também com trapezistas, equilibristas, saltadores, palhaços, e uma coleção de animais adestrados, incluindo porcos, macacos, cães e burros. Até “caipiras” eram apresentados como atração de circo, junto com talentosos cançonetistas. Um destaque especial foram as acrobacias dos Irmãos Queirolo Junior, pertencentes à tradicional família Queirolo, uma das mais tradicionais do circo no Brasil.Espetáculos como os do Circus Record, devido à sua qualidade e originalidade, aumentavam a admiração do público local pelas atrações circenses. Isso ajudava a consolidar a região como uma rota importante para as companhias mais renomadas do gênero.

* Márcio Zago é artista plástico, artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”.
Criador e curador da Semana André Carneiro.