Amadeu Amaral e a Pedra Grande
Em 1940, o pesquisador Nelson Silveira Martins publicou o livro “Atibaia – O Paraíso Possível na Terra”, incorporando a frase de Amadeu Amaral, mas suprimindo seu início, a palavra “É quase”.
Márcio Zago
Em outubro de 1927, o jornal O Atibaiense publicou a crônica “Na Pedra Grande”, de Amadeu Amaral. O escritor, natural de Capivari, SP, dedicou-se ao jornalismo, à poesia e foi pioneiro no estudo do dialeto caipira. Foi membro da Academia Brasileira de Letras, ocupando a cadeira que pertenceu a Olavo Bilac, sendo um velho conhecido de Atibaia em razão das frequentes visitas que fazia à cidade.
Nesta crônica, ele registrou suas impressões sobre um passeio à Pedra Grande, texto que se transformou num ícone para a cidade em razão da frase final, onde arrematava: “É quase o paraíso possível na terra…”. Em 1940, o pesquisador Nelson Silveira Martins publicou o livro “Atibaia – O Paraíso Possível na Terra”, incorporando a frase de Amadeu Amaral, mas suprimindo seu início, a palavra “É quase”. Mais tarde, em 1970, André Carneiro também utilizou a frase de Amadeu Amaral. André, na época, era diretor de cultura e turismo de Atibaia na gestão do Prefeito Olavo Amorim Silveira e produziu um cartaz para promover turisticamente a cidade.
No cartaz figurava a foto de uma moça de costas sobre a Pedra Grande, tendo a cidade à frente. A moça era Lina, esposa de André Carneiro, que utilizava uma peruca loira. No topo do cartaz, a palavra “Atibaia” e no rodapé “O Paraíso quase possível na terra”. Como se nota, a frase também foi alterada por André Carneiro, trocando de lugar a palavra “quase”, segundo ele, para torná-la de mais fácil compreensão. Na crônica, Amadeu Amaral descrevia de forma poética sua visão da cidade: “Panorama Soberbo. Atibaia, sob nossos pés, perde o relevo de suas graciosas colinas e dá a ideia de um brinquedo alemão de casinhas, abandonado no meio de um imenso jardim.
Ao longe, pontos brancos, arquipelagozinhos de pontos brancos, manchas de pontos confluentes, são povoados, cidades: aqui, Guaxinduva, mais além, Piracaia, mais adiante, qualquer coisa de Bragança, e até, nos confins, algo onde se advinham pedaços da capital. A Serra do Lopo levanta, ao longe, as suas ondulações azuis, onde São Paulo e Minas se confundem.
E por todo o círculo enorme os olhos correm, passeiam, voam, estacam, retrocedem, bebendo todos os matizes do verde e do azul, do violeta e do cinzento, que se fundem uns nos outros, como em gigantesca tapeçaria e aos quais as variações da luz, graças às nuvens que passam, parecem dar uma espécie de vida e movimento. Terras cultivadas e baldias, pastagens, campões e capoeiras, macegas, arvoredos, vales fofos, cabeços e espigões enxutos e rijos – uma imensidade de terras, uma imensidade de trabalho e de energia, uma imensidade de solidão melancólica…”. Além da descrição do espaço, a topografia e suas vegetações, Amadeu Amaral também fazia referência ao passado e ao presente da cidade, além de uma projeção sobre seu futuro, lembrando que o “futuro” é hoje: “Vi o presente de Atibaia, e vi seu futuro – as terras circundantes supervalorizadas e exploradas palmo a palmo, os caminhos multiplicados num largo sistema venoso, ressoante de atividade, as chaminés empenachadas de fumo, a cidade desdobrada em altura e largura, e toda a redondeza enriquecida de paisagem ainda mais linda e mais agradável – paisagem de pomares e de granjas, de jardins e de veigas, de casas confortáveis e de plantações viçosas, de estradas largas e lisas e de jeiras fecundas, – o homem num conflito constante, vivaz e alegre com a natureza, as obras do homem entrelaçadas com as da natureza, conflito e harmonia, luta e idílio, batalhas tenazes e reconciliações deliciosas na abundância e na felicidade… Esse, por certo, o futuro de Atibaia e de toda esta zona. Sua beleza e seu clima são duas riquezas abençoadas.
Atibaia atrai, convida, enlaça, e dá aos seus enfeitiçados a recompensa da saúde. É quase o paraíso possível na terra…”.Fica ao leitor a oportunidade de descobrir (ou redescobrir) essa crônica e sua importância para a cidade, além de opinar sobre as previsões de Amadeu Amaral para com o futuro da cidade.
* Márcio Zago é artista plástico, artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”.
Criador e curador da Semana André Carneiro.