Uma peça teatral por mês
Márcio Zago
Corria o ano de 1903. Com a formalização do Grupo Dramático Carlos Gomes a cena teatral da cidade ganhava eventos regulares. Depois do sucesso do primeiro recital, com as comédias “Os Dois Surdos”,” Meias Solas e Tacões” e “O Marido Vítima da Moda”, o segundo recital aconteceu um mês depois com a drama “Leonardo, o pescador”.
O jornal O Atibaiense naquele ano, na pessoa de seu diretor José Antônio Silveira Maia, escreveu: “Para avaliarmos a importância deste drama, ensaiado com todo capricho, basta relatarmos aqui a denominação dos quadros: O primeiro ato “O Incêndio” da Choupana do “Leonardo, o pescador”, de deslumbrante efeito; o segundo ato, “O Palácio do vício”, luxuosamente mobiliado; e o terceiro ato “A Regeneração”, bosques, tendo ao lado uma taberna, os quais já se acham desde já em execução pelo pintor J. Momo.
Temos a acrescentar que o papel de Leonardo será fielmente interpretado pelo amigo Palhares e os restantes pelos senhores Napoleão Maia, Antônio Almeida, Jerônymo Momo, M. Marques, A. Brazil e senhora N. O. Paganelli. A orquestra já tem ensaiado novas peças que, como da outra vez, deliciarão os espectadores, encantados pela batuta do professor Salles Bastos e Juvêncio Fonseca (…)”. A regularidade das apresentações no teatrinho incentivou os integrantes do Grupo Dramático Carlos Gomes a investir no espaço.
No final de 1903 foram instalados uma campainha e encanamento para a iluminação a gás acetileno, invenção do atibaiano Ettore Carrieri. Até então a iluminação era com lamparinas a querosene e o sinal do espetáculo vinha de uma velha enxada, como descrita por Waldomiro Franco da Silveira no livro História de Atibaia. O terceiro recital ocorreu no dia 25 de dezembro, com a “chistosa” comédia em dois atos “Casar para Morrer!”, além da peça “Cada Doido com sua Mania”, verdadeira “fabrica de gargalhadas”.
No dia seguinte a peça “Leonardo, o pescador” foi reapresentada, em razão do sucesso anterior. O quarto recital foi com o drama “A Esposa Mártir” e a comédia “O Fura Vidas”, que ocorreu no final de janeiro de 1904.
A nota curiosa ficou por conta da notícia de que a orquestra seria regida somente pelo Juvêncio Fonseca, em razão da ausência do maestro Salles Bastos, e que a banda musical não percorreria as ruas da cidade anunciando o espetáculo, como era costume: “O sinal serão os foguetes à noite”. Nota-se a integração existente na época entre os diferentes artistas e até mesmo quem não era artista, mas que se dispunha a contribuir com as ações culturais que começavam a surgir: A Corporação Musical 24 de Maio tocava pelas ruas da cidade anunciando novos espetáculos; artistas plásticos como Jerônimo Momo pintavam cenários e construíam objetos cênicos; músicos como Juvêncio Fonseca e Salles Bastos sonorizavam as peças; comerciantes e professores como Pedro Palhares e Napoleão Maia viravam atores. Até mesmo Juvenal Alvim, importante politico na época, assume a presidência da Sociedade Recreativa Carlos Gomes durante a gestão de 1904, associação que dava sustentação ao Grupo Dramático Carlos Gomes. Tudo para alavancar as embrionárias ações culturais que começavam a surgir com a urbanização da cidade. A nova repúblicatrazia ares progressistas e Atibaia sentia seus reflexos.
* Márcio Zago é artista plástico, artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”.
Criador e curador da Semana André Carneiro.