Prêmio Pulitzer valorizou adolescente pelo princípio fundamental do jornalismo
Luiz Gonzaga Neto
Darnella Frazier, a adolescente que filmou o assassinato de George Floyd, ganhou o Pulitzer honorário de 2021. Foi homenageada com citação especial e prêmio de 15 mil dólares para seu vídeo, que “gerou protestos contra a brutalidade policial em todo o mundo”. É um dos registros mais importantes do racismo estrutural da sociedade ocidental.
Segundo a publicação The 19th, o ato refletia muitos dos princípios fundamentais do jornalismo: afligir os que estão confortáveis, iluminar as transgressões, testemunhar em nome dos marginalizados, falar a verdade ao poder. Não era seu trabalho, mas Frazier o descreveu como seu dever. Um ato de dizer a verdade jornalística.
O jornalista e escritor Laurentino Gomes lançou o segundo volume de sua trilogia “Escravidão”, mostrando mais uma vez a necessidade de uma segunda Abolição no Brasil. Para mim, o primeiro livro já foi muito impactante por revelar os 350 anos do tráfico negreiro entre África e o nosso querido (e devedor) país.
Debora de Lucas, editora sênior do Intercept, fez um resumo interessante do problema racial. Depois de 25 anos do clipe de Michael Jackson, “They don’t care about us” (Eles não ligam para nós) no Morro da Dona Marta, no Rio de Janeiro, e no Pelourinho, em Salvador, dirigido por Spike Lee, chegamos ao paralelo: o Brasil não liga para a população negra.
Há mais de mil dias a pergunta “Quem matou Marielle Franco?” continua ecoando. O assassinato do negro João Alberto Silveira Freitas, 40 anos, por dois seguranças brancos em 19 de novembro, véspera do Dia da Consciência Negra, no Carrefour em Porto Alegre, ainda é uma ferida aberta.
Desde 27 de dezembro, os meninos negros de Belford Roxo Lucas Matheus, Alexandre e Fernando Henrique seguem desaparecidos. Após mais de um ano, o descaso de Sarí Côrte Real, que motivou a queda do 9º andar e a morte do menino negro Miguel Otávio Santana da Silva, cinco anos, no Recife, ainda não foi punido.
Em 8 de junho, Kathlen Romeu, 24 anos, grávida de quatro meses, morreu durante uma ação policial no Complexo do Lins, no Rio. A jovem negra, que havia saído da comunidade por medo da violência, foi atingida por uma bala perdida enquanto visitava a avó.
A Farm, ex-empregadora de Kathlen, aproveitou para lucrar com a morte da moça. A descolada marca carioca publicou um post no Instagram anunciando que a comissão das compras feitas no código de Kathlen seria revertida para a família da jovem. Como já entoou a divina Elza Soares: “A carne mais barata do mercado é a carne negra”.
Uma bala perdida também matou Thiago Conceição, 16 anos, em 18 de junho, na Penha, no Rio. Durante a operação Coalizão Pelo Bem, o jovem foi atingido quando estava em casa. No Dia dos Namorados, 12 de junho, o instrutor de surfe negro Matheus Ribeiro da Cruz, 22 anos, foi acusado por um casal de jovens brancos, Mariana Spinelli e Tomás Oliveira, de roubar a própria bicicleta elétrica.
Os jovens negros Felipe Barbosa da Silva, entregador de aplicativos, 23 anos, e Vinícius Alves Procópio, monitor de perua escolar, 19 anos, no bairro Santo Amaro, foram assassinados por policiais. A investigação do caso segue em curso. Diversas pesquisas apontam que a população negra é mais vulnerável e morre mais de covid-19 no Brasil. Mesmo assim, não há campanhas de vacinação voltadas para esse grupo.
* Luiz Gonzaga Neto é jornalista, analista em comunicação da Câmara de Atibaia e blogueiro, autor de brincantedeletras.wordpress.com. Esta coluna pode ser lida também no site do jornal O Atibaiense – www.oatibaiense.com.br.