Parabéns para quem?
Em 29 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente e tamanhas estatísticas de violência, o que há para comemorar?
Anna Luiza Calixto
13 de julho de 1990: é conquistado o Estatuto da Criança e do Adolescente. Pelo sangue e pelas mãos de quarenta milhões de brasileiros, pela força dos movimentos sociais e pelo olhar atento à meninos e meninas, não mais como objetos – presos na condição de vir a ser adulto -, mas sujeitos de direitos.
Vinte e nove anos depois da concepção do ECA, recebemos a estatística de que a cada dez crianças brasileiras, seis estão em situação de pobreza e violação de direitos, o que nos leva a temer que o Estatuto seja uma promessa constitucional que nos conforta no papel. Palavras como “prioridade absoluta” e “proteção integral” completando 29 anos, sem que muitas de nossas crianças conheçam o seu significado na pele.
Não raro observamos que, no Brasil e no mundo, a magnitude de nossas rachaduras sociais se torna motivo para o comodismo de quem dorme sobre elas. A transformação do mundo não vai acontecer enquanto olharmos para ela sob o prisma de sua dificuldade. Se cada um que está lendo este texto assumisse o desafio de transformar o seu próprio universo, o carrinho de tijolos para a construção de uma realidade mais justa e igualitária estaria muito mais leve.
A resolução de mazelas sociais não nasce apenas nas grandes instituições sociais, nos singulares eventos beneficentes e nos bolsos dos empresários bem sucedidos. Você é tão importante quanto ao falar sobre isto dentro da sala de aula, no almoço de domingo e na reunião de sexta feira.
Em meio a tantas ameaças e retrocessos, tudo o que podemos desejar ao ECA, em seu aniversário, é que ele não seja lançado à latrina e que nossa população compreenda e seja sensível às violências que matam e violam os pequenos brasileiros diariamente. O cenário nos traz um governo que é fiel ao discurso de ódio; permissível quanto ao preconceito e aliado à violências.
O presente que devemos dar ao ECA por seus vinte e nove anos é a nossa luta, uma resistência sensível e necessária. Toda criança é nossa criança. Vinte e nove anos de direitos que não podem ser negociados, de conquistas populares. Junto ao ECA, todos completamos vinte e nove anos: nossos direitos, nossas crianças – não mais menores – e, principalmente, nossa esperança. O que estamos comemorando?