Sarau da Jandyra reúne mulheres atibaienses para atos de arte e resistência
Com pano de fundo musical e poético, o encontro tem foco na emancipação feminina e na exaltação da produção artística do município de Atibaia.
Anna Luiza Calixto
Jandyra Massoni: brilhante musicista, compositora e maestrina atibaiense, cujo nome é lembrado por aqueles que cruzaram o seu caminho não apenas pela produção artística e atuação no campo musical da cidade, mas por seu talento, generosidade e dedicação ao ofício cotidiano de levar cultura, conhecimento e experiências ricas em saberes para a população do território do município, ecoando sua voz pelas ruas inabalavelmente, em seu carro em que sempre havia espaço para mais um aluno, amigo, músico, curioso. Jandyra era assim: professora, amiga, ativista, musicista, maestrina, companheira, curiosa. Era voz e ouvidos.
Há vinte e sete anos, sua voz deixou de ecoar no plano material para – lá de cima – cantar e inspirar quem, aqui na Terra, sente a sua falta. Falta de quem ela é e da força que a sua presença tem. Verbos no presente porque Jandyra está presente. Ainda mais no que depender das mulheres responsáveis pelo Sarau da Jandyra, encontro que leva o nome e a alma da maestrina, que reúne cantoras, compositoras, escritoras, poetas, atrizes, contadoras de histórias, artistas plásticas, ativistas e todas que acreditam no poder da arte para representar aquilo em que acreditam: paridade de gênero; emancipação feminina e a valorização da produção artística local.
Neste domingo (17) ocorreu a nona Edição do Sarau da Jandyra, inaugurando o dois mil e dezenove do movimento – após a Edição Especial do Dia Internacional da Mulher –, tomando o palco da ATA (Associação Teatral de Atibaia) com poesias, discussões, leituras, cortejos; cirandas; histórias, canções e brados, entoados por vozes femininas. Ponto, este, válido para ser destacado: a programação do Sarau é inteira de ‘manas’, promovendo a representatividade feminina – tão velada no campo artístico (e nos outros campos também) – e servindo de ponto de encontro para quem acredita e defende tais ideais, trocando experiências e falando sobre suas composições e saberes enquanto mulher. Protagonismo feminino em pauta.
Quem também marcou presença e levantou o debate sobre sua atual circunstância foi a Associação do Casarão Júlia Ferraz, que distribuiu entre as presentes seu folhetim a respeito da desapropriação proposta pela Prefeitura Municipal de Atibaia. “Nós, do Casarão, fazemos a nossa parte. Já temos projeto aprovado pelo Condephaat e fomos selecionados pelo edital do Fundo dos Interesses Difusos para executar a estabilização do prédio. Ou seja, o recurso finalmente foi conquistado. Não é aceitável que, quando as condições para manter o Casarão são disponibilizadas, ele seja desapropriado.” – afirma Rosana Ferraz, representando a Associação do Casarão.
Em meio à roda de conversa formada durante a introdução do Sarau,Taiana Ferraz, também representando a Associação, destacou a funcionalidade do Casarão Júlia Ferraz como polo cultural para o município: “O Casarão é lar para diversas atividades sócio culturais e artísticas de Atibaia, bem como o próprio Sarau da Jandyra, que lá nasceu. Uma de nossas preocupações primárias é o destino do Casarão depois da possível desapropriação: ele pode ficarfechado durante anos, em obras intermináveis e, em decorrência disto, todas as intervenções que acontecem lá serem deslocadas ou suspensas por tempo indeterminado, sem uma justificativa válida.” A representante ainda deu destaque para os equipamentos culturais da Prefeitura que tiveram suas portas fechadas para obras de manutenção e ainda não voltaram ao acesso público, comoo Cine Itáe a Casa JandyraMassoni, aberta para dar continuidade ao brilhante legado deixado pela musicista.
Mulher e artista: Jandyra fazia de sua casa avarandada, na Rua Treze de Maio, lar de quem toca, canta e ouve. Fez de suas janelas vista para muito além do mirante: oportunidades e novas perspectivas para quem frequentava sua garagem, para participar ou prestigiar os Saraus que ela idealizava e realizava todas as quintas feiras – os Saraus da Jandyra –, perambulando as ruas atibaienses com seu fusca para buscar quem morasse distante do território central e desejasse fazer parte do coral ou ter aulas de piano e voz.
“O Sarau da Jandyra nasce de dois desejos: retomar o nome da grande JandyraMassoni e levar sua história para a população do município, para que conheçam a importância de sua caminhada no campo artístico cultural de Atibaia; bem como promover a representatividade feminina neste campo, causando este encontro de diferentes linguagens artísticas para um polo de mulheres que passam a fazer parte de um intercâmbio responsável por várias experiências que não seriam possíveis sem o encontro da arte das ‘manas’.” – compartilha, em entrevista exclusiva ao Jornal O Atibaiense, a atriz, cantora, compositora e fundadora do Sarau da Jandyra, Isadora Títto. “Jandyra foi minha madrinha, além de peça de minha admiração. Foi em sua garagem, lar dos Saraus, que cantei pela primeira vez. Assim, é uma enorme felicidade ver Jandyras – que é como chamamos as mulheres que fazem parte do Sarau – passando por seu nascimento artístico durante nossos encontros. Em toda a minha trajetória como musicista, sempre me vi ao lado de muitos músicos, bem como outras artistas atibaienses, em suas respectivas áreas. O Sarau, portanto, nasce – além destes desejos – de uma necessidade bastante presente na vida da comunidade artística feminina da cidade.”, continua.
O sorriso sempre aberto e a voz encantadora e forte, com a casa cheia e canções que transcendiam as paredes de sua garagem, inspiraram mais de oitenta artistas que já passaram pelo palco do Sarau da Jandyra, encontro este que participou do Festival Internacional de Teatro Comunitário (Panamérica Utópica) e já aconteceu na Escola Estadual Carlos José Ribeiro; na Casinha Leve à Leve; na Casa VIVA (em Piracaia), na ATA Cultural e, na maior parte de suas Edições – inclusive a primeira delas – no Casarão Júlia Ferraz, cuja Associação em parceria foi indispensável para o crescimento e consolidação do Sarau como ponto de encontro feminino em nome de sua arte e luta.
Preservação da memória e fortalecimento da emancipação feminina. Arte e luta, em um encontro de vozes em um alento: entre todas as linguagens artísticas, uma deve ser comum a todo aquele que canta, declama, toca, escreve, e à você, que lê: o amor. E quando se trata desta forma de arte, Jandyra foi e é nossa maestrina.
Para mais informações, acesse: www.facebook.com/saraudajandyra