A Festa de Santa Cruz

As novenas aconteciam sob os cuidados de um capelão, religioso intuitivo e aceito pela sociedade como representante da igreja.

Marcio Zago

Em Atibaia de outrora, onde houvesse uma capela ou uma cruz eram realizadas as festividades da Santa Cruz. As celebrações aconteciam no mês de maio em todos os bairros do município, mas um delesganhou notoriedade: A festa que acontecia onde hoje se encontra a Praça Miguel Vairo, ou Praça da Santa Casa.Lugar este que já foi nomeado Largo da Forca e Largo da Cruz.
Esse espaço abrigou por muitos anos o Santo Cruzeiro, que numa descrição do Almanaque de Bragança, datado de 1900, assim o descrevia: “…O tradicional Santo Cruzeiro, uma capelinha elegante onde todos os fiéis católicos fazem suas romarias diárias…É um modesto templo erigido no maior planalto de Atibaia de onde se descortinam todas as montanhas que circundam o município e as divisas até Minas Gerais. No pátio da capela existe um grande cruzeiro com todos os martírios do Redentor, nada faltando…”. No período da festa o local era todo enfeitado com flores e bambus, tendo na parte religiosa missas e novenas, e na parte social os leilões, queimas de fogos, apresentações das bandas musicais, congadas, etc.
As novenas aconteciam sob os cuidados de um capelão, religioso intuitivo e aceito pela sociedade como representante da igreja. Em geral eram pessoas simples, de grande fé religiosa, que conduziam as celebrações utilizando também citações em latim. De transmissão oral, as ladainhas, como são chamadas,sofriam constantes modificações e adaptações em seu sentido original como o descrito no livro “Atibaia Folclórica” de João Batista Conti: Regina Patriarcharum, por “Partiu a cara”; Foederis Arca,por “Fede na arca”; Virgo Potens, por”Virge no pote”,e outros. Fato que, embora irônico para os letrados, em nada desqualifica a expressão religiosa e sincera do povo simples que a professa.
A partir do inicio do século XX a Festa do Santo Cruzeiro ganhou importância com os cuidados do português Castro Fafe. Católico fervoroso, José Antônio de Castro Fafe, foi zelador da igrejinha e promoveu inúmeras ações para abrilhantar suas festividades. Em 1904 Castro Fafe requereu, e conseguiu, da Câmara Municipal um terreno para edificarali um coreto, que na época era dos poucos espaços de promoção da música. Logo o coreto se transformou em importante aglutinador das ações culturais do município e palco de inúmeras apresentações da Banda Musical União da Mocidade, dos irmãos Fonseca.
Castro Fafe também se envolveu com o teatro local promovendo apresentações que visavam arrecadar recursos para a festa.Por muitos anosas festividades do Santo Cruzeiro arregimentaramosfiéis moradores de Atibaia, atraídos pelos fogos de artifícios que rompiam o silencio das frias manhãs do mês de maio. Era mais uma celebração a Santa Cruz, símbolo da paixão, morte e ressurreição de Cristo. Tradição que perdura pelos bairros afastados, mas extinto do centro urbano pelo crescimento da cidade que,dia a dia, sepulta seu passado e suas histórias.

Márcio Zago é artista plástico e artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”. É criador e curador da Semana André Carneiro.