O entrudo de 1906

“O mais estrondoso carnaval que houve e haverá, nunca, jamais, em tempo algum”.

Márcio Zago

Assim foi anunciado nas páginas do jornal “O Atibaiense” o carnaval daquele ano. A organização foi de uma comissão tirada do Clube Recreativo Atibaianoque incluía os Drs.Miguel Vairo, Major Juvenal Alvim, Florêncio Pires, Prof. Salles Bastos e Sebastião de Castro Neves. De São Paulo viriam os “fogos de bengala” que prometiam uma “aparência fantástica, envolta numa ardência cromática, diabólica, piramido-colosso de saturnicabeleza.”O destaque era o desfile de seis carros alegóricos.
O primeiro era o carro do estandarte (bastante valorizado na época), onde uma barca deslizaria sobre as ondas e dois meninos, luxuosamente vestidos, representariam os remadores. Na popa outra criança empunharia o leme. A beira da praia uma enorme concha que se abriria e dentro uma senhorita vestida de pérola empunharia o estandarte do Clube Recreativo. Esse carro foi o mais comentado na edição seguinte do jornal. A porta estandarte foi vivida pela jovem Izaura Pierotti, que trajava uma toilette de cetim branco.
O segundo carro estava previsto para ser enorme, onde teria um globo dividido geograficamente em cinco partes do mundo. Em cima da esfera um anjo empunharia uma coroa de louros. Em primeiro plano, uma artística coluna e um grande livro com a História de Atibaia. O terceiro carroseria o da crítica ao bonde elétrico (objeto de desejo da elite local), da iluminação (que seria instalada em breve) e do esgoto (idem).
O Bonde teria cinco bancadas onde sentariam vários mocinhos e mocinhas. “De um ladoiriam os postes de luz e do outro uma bacia “Unitas”(?) unida e agregada à rede de esgoto…Uma perfeição!”. Os carros eram de concepção artística do novo morador da cidade, o Sr. Alexandre Paganelli.
O quarto carro teria um barco a singrar um dos nossos rios a toda pressa…O resto era surpresa.
O quinto carro uma homenagemàs celebres touradas do Circo Procópio, “engenhosamente concebida e que vai dar muita sorte”. O Circo Procópio esteve montado do Largo do Mercado alguns meses antes do carnaval e provocou grande admiração na população. As atrações incluíam espetáculos equestres, mímicos e acrobáticos, além da estreia do famoso toureiro Antônio Corajoso.
Na abertura do desfile carnavalesco estava previsto a participação de dois músicos que tocariam estridentes clarins montados em cavalos brancos.Nos espaços entre os carros alegóricos passariamtroles com “gentis senhoritas fantasiadas” e fechando comchave de ouro o “terrível Zé Pereira”. Ficou curioso em saber como eram movidos os carros alegóricos, uma vez que o primeiro automóvel só chegaria a Atibaia anos depois? Numa crônica do próprio jornal a resposta: “… carros alegóricos legitimamente tracionados e puxados a substancia por nove juntas de alentados bois percorreram, com a pachorra própria desses ruminantes, as ruas da cidade”.

Márcio Zago é artista plástico e artista gráfico de formação autodidata, fundador do Instituto Garatuja e autor do livro “Expressão Gráfica da Criança nas Oficinas do Garatuja”. É criador e curador da Semana André Carneiro.