Mídia e democracia vivem drama neste século XXI
A utopia do acesso ampliado à produção e disseminação de conteúdo proporcionado pelas novas tecnologias rapidamente se converteu em um enorme desafio político de feições autoritárias. Houve a Primavera Árabe, mas também governantes ditatoriais utilizando as redes sociais para marcar posição e “destruir inimigos”.
O momento é de avaliar em que ponto estamos neste desvio ou nova caminhada. As eleições municipais de 2020 serão, certamente, oportunidade para verificar, na prática, como ficou a guerra virtual entre setores polarizados, talvez a maior ameaça da midiática à democracia.
Como apontou o professor Filipe Campante, “os próprios políticos e governantes rapidamente se deram conta de que essa dispersão pode ser explorada em seu benefício. Afinal, eles agora também são geradores e propagadores de conteúdo, não mais necessitando passar pela mídia tradicional para levar suas mensagens aos eleitores. Da mesma forma, eles podem usar as mídias sociais como ferramentas de mobilização em seu proveito”. Neste sentido, a mídia tradicional precisa se reposicionar, funcionando mais no monitoramento dos conflitos.
Para ele, “a expansão do acesso à Internet inicialmente desmobilizou eleitores, mas eventualmente permitiu o crescimento de forças políticas que os trouxeram de volta ao cenário eleitoral, sob bandeiras eminentemente populistas”. O professor está investigando como a expansão do Facebook no Brasil pode ter contribuído para reduzir a necessidade de os políticos responderem às demandas do eleitorado local, na medida em que lhes permite consolidar o apoio de seus eleitores mais ferrenhos.
“Com efeito, os populistas e autoritários têm-se revelado os grandes beneficiários, na arena política, dessas transformações. No século XXI, um regime autoritário não precisa mais controlar a mídia a ferro e a fogo para manter-se no poder; pode recorrer a algo muito mais barato: a desinformação. Ocorre que é extremamente barato distribuir desinformação no ambiente de mídia atual e é sintomático que o próprio termo ‘fake news’ já tenha sido devidamente apropriado por líderes de inclinações autoritárias. As consequências dramáticas para a democracia, no plano mundial, estão apenas começando a emergir”, alertou Campante.